domingo, 29 de abril de 2007
Blog Atlântico: A comunidade das democracias, o Henrique e a Índia
O MP3
Mas nem precisava de ter dado essa garantia. Para eles é tudo óbvio. Tomam conta do caso. Um faz de bom cop e procura dialogar. O outro faz de mau e ameaça, forte e feio. Já são meia-noite e entendemo-nos todos - mas eu já só sou observador, alienado, marginalizado, como que já desconfiando que devia ter procurado mais vezes. O electricista garante-nos que vai tentar falar amanhã com os seus assistentes e obrigá-los a devolver o objecto desaparecido. Volto para casa. Aprendo uma lição de vida. Encontro o MP3.
No dia seguinte houve direito a desculpa pessoal e entrega de uma generosa (e envergonhada) caixa com doces. Só sorriu e só me disse "isso são coisas da vida, não faz mal".
42ºC
O grande mercado de rins (Expresso)
O grande mercado de rins
INDRANIL MUKHERJEE/ AFP/ GETTY IMAGES
H. S. JAYARAMU tem 40 anos (atrás vê-se mulher e a neta) e vive a 120 quilómetros de Bangalore. Jayaramu já vendeu um rim
Na sala de espera deste gigantesco hospital privado em Nova Deli estão sentados vários estrangeiros, aguardando uma consulta no departamento de transplante de órgãos. São de vários continentes, mas todos procuram um rim novo, num país onde as leis sobre o tráfego e transplante de órgãos são tão restritivas como no Ocidente, mas largamente desrespeitadas. O tráfego ilegal de rins é uma indústria florescente na Índia.
O atraente pacote oferece aos estrangeiros um serviço da melhor qualidade internacional e inclui quase tudo: recepção no aeroporto, alojamento, excursão ao Taj Mahal, serviço de intérprete, gastronomia especial, entre outras regalias que pretendem afastar a imagem de pobreza e falta de higiene tradicionalmente associada ao país.
Mas, na forma de um rim, essa Índia subdesenvolvida consegue entrar directamente para o interior das luxuosas salas de operação. Ao viajar de volta, é provável que o paciente tenha um rim perfeitamente funcional, mas originalmente pertencente a um agricultor indiano forçado a vendê-lo para escapar ao endividamento.
No panorama doméstico, a procura de rins é tremenda, sendo que anualmente é diagnosticada uma insuficiência renal crónica a mais de 150 mil indianos. A oferta não fica atrás. Por algo equivalente entre 600 e 1100 Euros, estima-se que milhares de indianos vendam um dos seus rins a redes criminosas que depois os revendem a hospitais privados e públicos.
Os intermediários asseguram a falsificação de documentos e os subornos necessários para inventar uma relação de parentesco entre o doador e o receptor, ou provar que há alguma ligação emocional que justifique a doação, os únicos casos aceites pela lei que regula os transplantes (HOTA). Mas as comissões de autorização, instituídas pelo governo, fecham os olhos aos princípios éticos e chegam a aprovar nove em dez processos.
A Índia, afirmando-se como um dos principais destinos para o turismo médico internacional, especialmente no sector dos transplantes de órgãos, é um grande mercado de rins e entrou em fase de expansão. Estima-se que o turismo médico irá atrair um milhão de pacientes estrangeiros e render mil milhões de euros anuais ao país. É, portanto, de esperar um aumento do número de rins transplantados ilegalmente, das empobrecidas zonas rurais indianas para o luxo do primeiro mundo.
Constantino Xavier, correspondente em Nova Deli
sexta-feira, 27 de abril de 2007
Citações de Deli: Rajdeep Sardessai
quinta-feira, 26 de abril de 2007
Revolução em curso (Nepal, reportagem)
Revolução em curso
Constantino Xavier, enviado a Katmandu
Quase vinte anos depois do início do conflito armado que provocou mais de 16 000 vítimas mortais, o Nepal parece estar em vias de pacificação. O acordo assinado esta semana entre a guerrilha maoísta e o Governo provisório visa acantonar as forças rebeldes e o Exército sob auspício das Nações Unidas e prevê a realização de eleições para uma nova assembleia constituinte.
Mas, tendo em conta o agitado passado político desde 1990, data do fim oficial da monarquia absolutista, este é só mais um tímido passo na transição para a democracia, no que é um dos países mais pobres do mundo. Uma transição marcada especialmente pelo crescente descontentamento das gerações mais novas com a crónica instabilidade política e os repetidos atropelos à democracia que tomaram conta do país desde então (foto: sacrífico de animais para a deusa Kali, num templo a sul de Katmandu).
Da parte dos partidos democráticos, a incapacidade de garantir estabilidade parlamentar, levando em média a um novo primeiro-ministro por ano na década de noventa. Da parte real, o autoritarismo do rei Gyanendra que, desde que tomou posse em 2001, foi gradualmente limitando o espaço democrático, acumulando de forma absolutista as funções de chefe de Estado e de Executivo. E da parte dos maoístas, uma administração paralela caracterizada pela coerção das campanhas de “consciencialização política” e mesmo pelo trabalho forçado e recrutamento de menores.
Tendo a Índia democrática e a China em robusto crescimento económico como vizinhos imediatos, a oposição dos jovens nepaleses não se fez esperar e culminou na onda de manifestações de Abril último, enfrentando o Exército fiel ao monarca. O rei recuou e um Governo provisório – uma aliança entre sete partidos democráticos com o apoio dos maoístas – passou a controlar os destinos do país e as esperanças das novas gerações.
Gagan Thapa (foto), de 29 anos de idade, é o Secretário Geral da União de Estudantes do Nepal e um dos líderes do movimento democrático. As pessoas cumprimentam-no respeitosamente em cada esquina por que passa. “Basta de alterações cosméticas e de revisões pontuais. É preciso mudar a estrutura inteira, eleger uma assembleia constituinte e incluir os maoístas. O poder de decisão deve ser dado às pessoas e não aos partidos ou ao rei”, defende numa conversa madrugadora, ainda o sol está a nascer sobre Kathmandu. Fora do hotel aguardo-o um colega numa mota, para se dirigirem a uma manifestação a 250 quilómetros da capital, onde ele será o orador principal.
“Em 1990 fomos iludidos. Éramos adolescentes e entusiastas e acreditámos que poderíamos conduzir o país para a democracia e a prosperidade. É por isso que hoje desconfiámos do rei, dos políticos e dos partidos”, lembra, explicando que o país vive uma transformação geracional. “Mais de 70% dos manifestantes em Abril eram jovens e quase 90% dos feridos e baleados eram estudantes. Num referendo no nosso campus universitário, mais de 90% votou a favor de um sistema republicano”, sublinha.
Embora durante o dia a cidade testemunhe grande tensão e dezenas de manifestações, quando escurece, Kathmandu é pacificamente tomada de assalto pelos jovens. Nas esplanadas flui o álcool e conversa-se animadamente sobre o rei ou sobre o seu filho, o príncipe Paras, ambos conhecidos pelo seu estilo de vida luxuoso e extravagante. “Isto ainda parece a Idade Média. De cada vez que passa o carro deles, a cidade tem que parar por completo. Devíamos juntar dinheiro e comprar-lhes um helicóptero”, sugere um dos jovens, enquanto um outro controla a televisão, indeciso entre a CNN e a Fashion TV.
Ujwal Acharya (foto), no início da casa dos trinta, é jornalista do diário “Kathmandu Post” e fundador do blog “United We Blog”. Quando o rei cortou, em Fevereiro, o acesso à Internet e à rede telefónica durante uma semana, e aprovou um decreto com que punia qualquer ofensa à sua pessoa, Ujwal passou à acção. “O exército era visita regular na nossa redacção e passou a editar o nosso jornal. Foi aí que percebemos o potencial da Internet, passando a escrever livremente no blog aquilo que testemunhávamos nas ruas e que ninguém tinha coragem de publicar”.
Com recurso ao servidor disponibilizado pela Embaixada dos EUA, o blog passou a ser um dos poucos sítios com informação fidedigna sobre os acontecimentos no terreno, atraindo milhares de visitantes diários. “Até o meu editor entregava-me material para publicar no blog”, refere com orgulho, lembrando, no entanto, as ameaças da polícia e as visitas à esquadra. “Não nos conseguiram intimidar. Afinal, já estavam tantos jornalistas na prisão que até nem me importava em lhes fazer companhia”, explica.
Para Ujwal, a experiência forçada com os métodos violentos do regime absolutista só reforçaram o sentimento democrático dos jovens. “Aprendemos a dar o valor devido à liberdade de expressão e ao papel da imprensa”, admite, enquanto responde a um comentário de encorajamento no seu blog.
Mas, para além dos limites da capital e das novas gerações em rápida modernização, assiste-se ainda a uma pobreza rural crónica e ao domínio preponderante da guerrilha maoísta. Um quarto do território fica a mais de uma semana de viagem da capital, só 50% das habitações têm acesso à rede eléctrica e pouco mais de 2% da população está coberta pela rede telefónica fixa.
É de Dhading, uma dessas regiões inóspitas e abandonadas, que vem Tara Bhandare, um jovem militante maoísta de 30 anos, pai de dois filhos e há quase quatro anos na Prisão Central de Kathmandu (foto). Detido por soldados à paisana, nunca foi formalmente acusado e aguarda julgamento desde então. “Disseram-me que era culpado de actividades terroristas”, diz, do outro lado do gradeamento e com um guarda ao lado controlando a conversa.
Tara faz parte de vários milhares de maoístas que se estima terem sido presos pelo exército com recurso à legislação draconiana (TADO) aprovada pelo rei em 2004 que, segundo diversos relatórios internacionais, viola os mais elementares direitos humanos. Mas, sinal dos tempos de mudança que se vivem no país, confiante de que irá ser libertado, Tara afirma repetidamente que “o rei é o alvo a abater e a república o objectivo a perseguir”.
Sobre as razões que o levaram a juntar-se aos rebeldes, é peremptório. “A educação deveria ser exclusivamente pública e gratuita. Actualmente, só as classes abastadas têm uma boa educação nas instituições privadas. O governo só cobre as zonas urbanas, deixando o mundo rural ao abandono. Nós combatemos essa discriminação, dando treino vocacional, formando as pessoas como cidadãos e dando-lhes educação em questões culturais, agrícolas e ambientais”, afirma, defendendo que a via armada era a única solução. “Em 1995 éramos pacíficos, com uma agenda construtiva redigida em 40 pontos. Mas fomos ignorados pelo Governo e ninguém nos deu atenção”, justifica, adicionando com confiança que “agora podemos ganhar o poder com a nossa própria força”.
É justamente sobre o objectivo dos maoístas que recaem as maiores dúvidas entre os nepaleses. Embora, em raras entrevistas, os seus líderes ideológicos tenham demonstrado um crescente comprometimento com a democracia multipartidária, há quem receie o contrário e veja no acordo desta semana nada mais do que uma estratégia na longa caminhada para um sistema comunista de partido único, tal como sempre advogado pelos rebeldes.
Rajendra Khetan, jovem director de um dos maiores grupos económicos do país e Vice-Presidente da Confederação das Indústrias Nepal (e Cônsul-Honorário de Portugal no Nepal), espelha estes receios, em conversa no seu opulento escritório no centro da cidade. “O Nepal tem um enorme potencial económico, especialmente em termos de recursos hidrográficos, mercado turístico e mesmo como ponte de trânsito comercial entre a China e a Índia. Mas receio que os maoístas, caso cheguem ao poder, levem a cabo os seus planos de nacionalização da economia e agitem ainda mais o frágil mercado de trabalho”.
Acima de tudo, Khetan queixa-se do impacto negativo da instabilidade política no desenvolvimento do país. A indústria hoteleira, o principal motor económico do Nepal, emprega cerca de um milhão de pessoas, mas está em profunda crise. Segundo dados oficiais, entre 1999 e 2005, o número de chegadas de turistas estrangeiros caiu em mais de 25%. As ruas de Thamel, o bairro turístico mais popular da capital, encontram-se quase desertas e a taxa de ocupação dos hotéis ronda os 40%. Ninguém tem interesse em visitar um país à beira de uma revolução.
Nos restantes sectores económicos, as infra-estruturas encontram-se subdesenvolvidas. As fábricas de Khetan, a poucos quilómetros de Kathmandu, sofrem há meses de constantes falhas na rede eléctrica e as greves dos sindicatos são mais e mais frequentes. “No papel somos uma economia de mercado liberal, mas continuamos a viver como no tempo em que éramos um protectorado britânico, com licenças de produção. Há que substituir a classe e a mentalidade política actualmente no poder. Há demasiado tempo que somos um país fechado sobre si mesmo”.
Com os seus 36 anos de idade e um vasto currículo internacional, Khetan incarna, no entanto, ele mesmo a mudança a que se assiste entre as gerações mais novas. Desapaixonado da política partidária e da família real, procura soluções e respostas no sistema económico e nos valores democráticos. “O Nepal é um mosaico de pobreza crónica e é flagelado pela fragmentação e discriminação contra as castas baixas, as mulheres e as minorias étnicas e religiosas. Há que oferecer um modelo de inclusão social e económico a estas pessoas, dando-lhes educação, formação e empregos. Só assim se poderá limitar o espaço de acção dos maoistas”, afirma.
Recuperou completamente um estábulo de um dos seus palácios, no centro de Kathmandu: Babar Mahal Revisited, hoje um dos centros comerciais mais luxuosos na cidade, com restaurantes, galerias de artes, artesanato, centro cultural e discoteca.
Recorda que por aqui passaram Sting, Steven Seagal, Lachlan Murdoch, entre outros jet-setters globais. “Nos anos 90 o Nepal era o sítio da moda, Todas as semanas aterravam aqui jactos privados com milionários e personalidades de todo o mundo. O meu palácio era palco das mais impressionantes festas e eventos culturais, tambores ecoando a cada esquina. Hoje, está tudo perdido e desolado. Toco tambor para mim mesmo”.
Também em termos políticos, vê uma crise: “em 1990 estávamos todos entusiastas com a abertura democrática, esperando uma nova fase de prosperidade. Mas foi uma desilusão. Os políticos que tomaram conta do Governo cresceram durante décadas num país fechado e absolutista, sem qualquer exposição a valores democráticos. Era óbvio que no Governo iriam espelhar os valores autoritários com que cresceram.”
No mesmo dia realiza-se o casamento entre a filha do chefe do exército nepalês e um aristocrata indiano de Barodá num hotel de luxo: só 150 convidados apareceram, num total de 300. “Já ninguém quer vir ao Nepal, têm todos medo de tiros e manifestações”.
“Isto é mais belo que a Suiça, não há dúvidas. Mas as pessoas vivem miseravelmente. Eu viajei extensivamente pelo mundo rural e as pessoas dizem-me que querem comida e não querem saber de rei, primeiro-ministro, maoístas etc”
“É impossível trabalhar assim. Os nossos investidores e clientes internacionais não querem saber das nossas particularidades e instabilidades políticas. Querem serviço prestado, garantias, segurança e qualidade. Coisa que actualmente nenhum empresário nepalês pode garantir”
“Não há alternativa nos Maoistas: são ultrapassados, antiquados e perigosos nos seus meios. Mas esperemos que se consigam adaptar”.
Aldrabando: Biblioteca universitária
quarta-feira, 25 de abril de 2007
Redescobrindo: Margão e Salcete (e Goa)
Quanto ao concelho, entre Salsete e Salcete, sugiro o último, embora ambas grafias possam ser aceites. Tudo menos as adaptações anglófonas e as suas variantes em concani, como Salset, Salsette e Salcette.
Sendo esta a primeira redescoberta de Goa no contexto desta série, relembro a complexidade do assunto. As grafias das localidades foram lusitanizadas ao longo de quinhentos anos, do concani vernacular para o português colonial. Já depois de 1961 entram em cena novas ideologias e línguas, para além de uma recuperação da topografia original autóctone, em concani.
Assim, coabitam o habitus topográfico goês a tradição colonial portuguesa (com bolsas de resistência estratégicas), a pré-modernidade local concani (agora revitalizada em movimentos como o Goa Hit-Rakhan Manch), a política de renomeação típica do pós-colonialismo (representada pelos nacionalistas hindus que quiseram que Vasco da Gama se chamasse Sambhajinagar), a dimensão anglófona por via da burocracia administrativa indiana (ou anglo-indiana?) e da globalização (turismo, entre outros) e, por fim, a bagagem linguística dos imigrantes de outros estados indianos (por via da sua dificuldade em pronunciarem alguns nomes).
Está introduzida a complexidade do assunto e reafirmado que esta série não se pretende imiscuir nesse debate. Pretende, isso sim, contribuir para que, em bom português, nos saibamos referir de forma correcta e consensual a locais em Goa.
Muita confiança (Atlântico, Junho 2006)
PASSAGEM PARA A ÍNDIA (série Correspondentes de Guerra)
CONSTANTINO XAVIER EM NOVA DELI
Revista Atlântico, Junho de 2006
MUITA CONFIANÇA
Rajiv é filho de um casal que emigrou dos famintos planaltos indostânicos para os subúrbios de Nova Deli. Na cidade, o ganha-pão da família dependia das pernas do pai, paquete numa repartição pública, e das mãos da mãe, empregada de limpeza. Um dia, ao voltar da escola, Rajiv viu numa papelaria o livro “Teach yourself English in seven days”. Hesitou, mas confiou no dono, que lhe disse que bastavam 900 palavras para dominar a língua. Afinal, pensou, a um ritmo de aprendizagem de 30 palavras novas por dia, seria daqui a três meses fluente na língua de todos os sonhos. Hoje Rajiv é engenheiro informático na Califórnia, vive num apartamento à beira-mar, e tem três televisões, dois frigoríficos, um carro e uma mota.
São estes os minúsculos épicos que movimentam a sociedade indiana contemporânea. Povoam a imaginação das gerações mais novas que acreditam ter chegado um momento e uma oportunidade histórica, para eles enquanto indivíduos e para o país em geral. A confiança que Rajiv depositou no enganador título do livro, bem como a sua fé no cliché do dono da papelaria pode parecer infantil, mas é o principal segredo da emergência indiana. Ao contrário da imagem tradicionalista e conservadora da Índia, o país testemunha actualmente uma mobilidade social e económica sem precedentes. Basta sonhar e trabalhar. Confiando.
E é o que leva, por exemplo, milhares de jovens a candidatarem-se, sem hesitar, a concursos para empregos, cursos ou bolsas de estudo que têm por vezes uma única vaga. Não há cartuchos a desperdiçar, mas também não há tempo para os contar. É preciso confiar e apostar. É por isso que a retórica conservadora dos Fóruns Sociais não encontra terreno fértil na Índia. Aqui ninguém quer conjugar o verbo “proteger”. Há todo um mundo à espera de ser conquistado.
É na economia que esta confiança mais se espelha. Segundo uma sondagem da ACNielsen a Índia apresenta os consumidores mais confiantes entre 42 países. 93% dos entrevistados classificam as perspectivas de emprego nos próximos doze meses de excelentes ou boas, e 87% descrevem de forma igual o estado das suas finanças pessoais. E enquanto que a nível mundial a média de entrevistados dispostos a investir na bolsa se fica pelos 25%, quase metade dos indianos mostra-se disposta a apostar no mercado accionista.
A confiança indiana alarga-se ao plano internacional. Mesmo com o Paquistão rival e nuclear logo ao lado, nem um único entrevistado classificou a possibilidade de uma guerra como preocupante, e 17% afirmam mesmo não ter qualquer preocupação (contra a média global de 10%). A atitude positiva e os primeiros lugares para a Índia repetem-se em temas como a militarização chinesa, a globalização ou a abertura à economia de mercado.
Há, claro, limitações importantes a apontar a este panorama confiante. As sondagens tendem a entrevistar a ainda minoritária classe média urbana e a ignorar os mais de 250 milhões de indianos que vivem abaixo do limiar da pobreza. Mas seria redutor justificar a confiança indiana como um mero entusiasmo momentâneo pelas reformas económicas que atravessam o país de Norte a Sul desde inícios dos anos noventa.
Há algo de mais profundo e estrutural que explica esta confiança. Por exemplo, a crença muito expandida de que a Índia é o berço de uma das grandes civilizações mundiais, mas que nunca lhe foi dada a oportunidade de se afirmar como tal. Invadida por sucessivas dinastias islâmicas, ocupada pelo colonialismo europeu e depois contida e isolada pela Guerra Fria, é agora uma Índia emergente, independente e poderosa que alimenta o imaginário nacional.
É daí que advém também o agudo sentimento de superioridade indiano. Por mais que o país simbolize pobreza crónica e desigualdades, a sua psique concebe uma Índia líder, velando pela ordem, paz e segurança internacional. Esta tradição tem origens históricas no conceito de “Chakravarti”, o tipo clássico de governante hindu devoto à estabilidade e que protege a sociedade e o mundo do caos e da anarquia. A própria constituição espelha esta tendência, recorrendo aos verbos paternalistas “promover”, “tutelar” e “encorajar” para descrever as responsabilidades internacionais do país.
É portanto precoce conceber a Índia simplesmente como um natural aliado democrático e amigo do Ocidente. É preciso compreender que a sua recente esquizofrenia diplomática encarna uma estratégia a longo prazo. Nova Deli procura reunir na sua manga o maior número de cartas possíveis, mesmo de forma contraditória e incoerente, namorando ao mesmo tempo Washington, Moscovo, Teerão e Pequim, e não abdicando de representar “a voz do Sul”.
Para a Índia e os indianos, os novos templos do consumo e as novas oportunidades internacionais não substituem os pagodes e as crenças do passado. Confia-se que tudo é compatível. Porque, como aqui gostam de dizer com orgulho, na Índia tudo é verdade, e o contrário também.
Maoístas, bloggers e empresários (Atlântico, Maio)
CONSTANTINO XAVIER EM NOVA DELI
MAOÍSTAS,
BLOGGERS E
EMPRESÁRIOS
A visita ao mítico Katmandu, que já não é assim tão mítico como se poderia pensar, conduz o nosso representante em terras da Índia numa viagem ao passado recente, quando ainda se lavava o sangue das ruas no único reino hindu do mundo. Uma reflexão que termina numa encruzilhada com espinhos.
"Parece que, da noite para o dia, a democracia floresceu como uma rosa e os maoístas se converteram ao fim da História. Mas estamos no século XXI e está visto que tudo é mais complicado do que o advogado pelo vintecentista Fukuyama. Como o vemos em Timor e o vimos há três décadas no nosso próprio país, os processos de democratização, embora imbuídos de idealismo, são períodos em que a instabilidade e as divergências políticas podem resultar rapidamente em violência crónica.
No caso do Nepal é pura utopia acreditar que os líderes maoístas,
ferrenhos ideólogos e responsáveis por toda uma administração paralela construída com sangue e suor, abandonem, por completo, a via armada e vistam o fato e a gravata da democracia liberal. Ainda por cima num dos países mais pobres do mundo, em que um quarto do território fica a mais de uma semana de viagem da capital, onde 80% depende da agricultura e em que a rede eléctrica cobre menos de metade das habitações."
domingo, 22 de abril de 2007
Redescobrindo: Rajastão
Domingos matrimoniais: Non-Resident Indian
"April 72 Born, Looks 28, Khatri, 6 Feet.Very Fair, very Handsome, British Passport Holder, Born and Brought up in Delhi, Computer Engineer/MBA London, Annual Income in Eight Figures, Owns Properties in London and South Delhi, Divorcee, Seeks Very Fair, Very Beautiful Girl not less than 5' 6'', Well Qualified, Broad Minded, willing to settle in U.K. No Caste, No Dowry, No Demand, Kindly send full Particulars. First Instance with Horoscope and Photo Returnable, Early Simple Registered Marriage, Parents in Delhi on Short Visit for Right Match. Box. GK..."
sábado, 21 de abril de 2007
Confiando: Lugar no comboio
sexta-feira, 20 de abril de 2007
Aldrabando: Oculista
Aldrabando: Quarto de hotel
Ao longo da estadia avolumam-se, depois, os defeitos: por baixo do cobertor a roupa de cama está esburacada e suja, a televisão, a ventoínha e o autoclismo não funcionam, o quarto ao lado é ocupado por dez estudantes barulhentos, há infiltrações, a janela não abre (ou não fecha), ao lado do hotel reina uma discoteca de noite, um terminal rodoviário de madrugada e uma escola primária de manhã. Etc.
Há ainda as várias taxes com que muitas vezes nos gostam de brindar aquando da apresentação final da conta, a súbita mudança do horário de check-out (logo: uma hora a mais equivale a pagar mais um dia inteiro) e as informações erradas que nos indicam em relação à partida do comboio ou do autocarro (logo: necessidade de ficar mais um dia e voltar ao hotel). É uma perspectiva generalizada, mas tudo parte das minhas experiências hoteleiras subcontinentais.
quinta-feira, 19 de abril de 2007
Redescobrindo: Assão
O orgulho hindu ferido
quarta-feira, 18 de abril de 2007
Billy Joel e as novas gerações indianas
O Atlântico já chegou à Índia
Desenganem-se os catastrofistas. Não é um efeito das alterações climáticas, mas o Oceano Atlântico já banha as costas indianas – politicamente, por enquanto. Provou-o a vinda de George Walker Bush, distribuindo doces (reactores) e citando Tagore, Gandhi e Nehru num discurso que fez os palpitantes corações indianos, tão ávidos da atenção das luzes da ribalta global, esquecer... Tagore, Gandhi e Nehru.
A Índia parece mais do que nunca disposta a esquecer a sua herança não-alinhada, o seu namoro russo socialista e militar, e mesmo a sua face pacifista, espiritual e oriental com que se apresentou aos ocidentais durante quase um século. Esqueçam Brama, Vishnu e Shiva e as centenas de divindades que completam o panteão hindu. A malta agora quer é McDonald’s, outsourcing e Disney Channel.
Esta história não é assim tão recente. Há duzentos anos que os indianos andam pela América do Norte e foi ali que se iniciou uma das suas frentes anti-coloniais, que viria a resultar na independência, em 1947, com o apoio de Franklin D. Roosevelt. Depois de se abrir a uma nova vaga de imigração indiana em 1965 (na qual chegou o Apu dos Simpsons), a comunidade floresceu até aos dois milhões actuais. É essa a diáspora que domina actualmente Silicon Valley e muitos outros clusters estratégicos em terras do Tio Sam. Em vez da “fuga de cérebros”, aqui já só se fala em “bancos de cérebros”. O fascínio não conhece limites. É na Índia que as sondagens encontram a imagem mais positiva da administração Bush no estrangeiro.
Ora, tudo isto é bom demais para ser desperdiçado, devem pensar em Washington. Ainda por cima no que é considerado o “século asiático”, com a ameaça “amarela” e islâmica logo ao lado. Deixemos as ondas atlânticas varrer distâncias mais longas e banhar as costas indianas, planeiam. A intervenção da NATO no Afeganistão foi só o primeiro sinal disso. A organização tem mesmo discutido a possibilidade de criar uma NATO asiática, entre o Ocidente e o Oriente, com a nação de Gandhi ao leme. As cinzas do Mahatma devem estar a arder de desgosto.
Reforcemos com alguns factos e números esta nova inclinação atlantista. Dos cerca de setenta novos postos diplomáticos norte-americanos a criar este ano, doze serão localizados na Índia. E depois de estarem em frentes opostas durante a Guerra Fria, Nova Deli e Washington têm organizado nos últimos anos dezenas de treinos militares conjuntos, como o jungle warfare nas florestas infestadas de maoístas, os anti-piracy maritime exercises ao longo da costa oceânica e o high altitude combat nos Himalaias.
Quando Bush afirmou na capital indiana que como “potência global” a Índia tem um “dever histórico de apoiar a democracia no mundo” e que “a América e a Índia estão juntas nesta Guerra”, não só foi ovacionado durante vários minutos, como também levou ao fundo todas as dúvidas: cá está o novo aliado asiático do Atlântico. Agora aceitam-se apostas para responder a uma nova questão: ao banhar a Índia emergente, quem irá o Atlântico submergir por estas bandas?
A expansão atlantista encaixa-se em algo mais amplo. Em pouco mais de dois anos, desde Janeiro de 2004, mais de quarenta chefes de Estado e/ou líderes de Governo prestaram uma visita oficial a Nova Deli, presenteando os indianos com atractivos pacotes e acordos de cooperação, como se estivessem, dois mil e seis anos depois, a homenagear a vinda de um novo Messias. Em 2004 a extensa lista incluiu Vladimir Putin, Lula da Silva e Gerhard Schroeder; em 2005 foi a vez de Wen Jiabao, Junichiro Koizumi, Tony Blair e José Manuel Barroso, enquanto que, já este ano, foi a vez de Jacques Chirac, George Bush e John Howard serem recebidos por Manmohan Singh. Todos à procura de garantir uma fatia do apetecível bolo indiano, talhado ao gosto do visitante com cobertura nuclear, económica, científica ou cultural. Ao ritmo actual, Portugal fica com as migalhas.
Mas há oposição. Aqui, na Universidade Jawaharlal Nehru (habituem-se a pronunciar nomes indianos, porque senão acabam como Bush, a chamar o primeiro-ministro de “Palestinian Singh”), reina a extrema-esquerda entre os movimentos estudantis. Estou, portanto com poucas saudades do meu antigo quartel académico na Avenida de Berna.
Aqui, tal como aí, predomina muitas vezes a hipocrisia. Enquanto preparam estratégias para colar cartazes contra o “bloqueio” a Cuba, ou discutem os cânticos que devem entoar a favor dos índios no México, os líderes estudantis passam o dia a beber chá e a comer petiscos que lhes são servidos por crianças, empregadas sem as mínimas condições e mesmo maltratadas pelos patrões. Mas há coisas mais importantes a fazer – como ser um bom cicerone, por exemplo. Desde que cheguei, há dois anos atrás, apenas a visita de um chefe de Estado não foi assobiada, boicotada ou acusada de “imperialista”. A proeza coube a Hugo Chávez.
segunda-feira, 16 de abril de 2007
Domingos matrimoniais: Divorcee/Widow
"A very Short time divorced issueless girl (Separated after few days of Marriage due to unavoidable reasons) Extra ordinary beautiful, 5'3'' (looks tall) 73 born (looks 25) A sweet natured girl having Blend of Traditional Values, slim, very fair, natural sharp features, convent educated throughout, highly qualified, talented girl belongs to well established famous cultural family having major interest in township & other business with 7 digits monthly income seeks suitable handsome qualified, well settled similar status alliance preferably Business / Industrialist from in or around Delhi, Working / Professionals / NRI may excuse. Only Unmarried / Issueless Divorcee Khatri/Arora will be considered. jackson1411@... or Box ... Hindustan Times, New Delhi 110001."
Confiando: Jornais
Sinal dos tempos
domingo, 15 de abril de 2007
Uma perspectiva geoliterária
Realmente sem comentários
"É uma força nacionalista a ter em conta, este movimento hindu, para eventuais alianças num futuro próximo, em nome da raiz indo-europeia, da liberdade e da diversidade religiosa".
Entretanto, um outro, noutro blogue, apelida os jovens indianos de nazis:
"Nazis indianos contra Cavaco Silva"
sábado, 14 de abril de 2007
Novidades Supergoa.com
AGENDA:
14/4/2007 • Assembleia Eleitoral da Casa de Goa (mandato 2007-2010)
15/4/2007 • Programa Contacto Goa está de volta na RTPi e RTP África
21/4/2007 • Almoço de Primavera da Revista Ecos do Oriente (Lisboa)
8/5/2007 • A Aula de Marinha de Goa, dos sécs. XVII a XIX (Palestra)
19/5/2007 • 7º Encontro Anual dos Beirenses (Quinta Velanciana)
ÚLTIMAS NOTÍCIAS:
14/4/2007: Bardez acolhe Casa dos Dragões goesa
Segundo o site oficial do Futebol Clube do Porto, Goa conta a partir deste mês com a 117ª delegação daquele clube nortenho. Com sede no distrito de Bardez, a iniciativa coube aos dragões goeses Bruno Coutinho e Lavino Rebelo, entre outros simpatizantes. É mais um laço de amizade desportiva luso-goesa.
13/4/2007: Documentos sobre S. Francisco Xavier na Torre do Tombo
Uma exposição sobre a linhagem de S. Francisco Xavier está patente no na Torre do Tombo até 31 de Maio. Poderá consultar 50 documentos relativos às origens de São Francisco Xavier e o respectivo enquadramento social e político, bem como a história do Castelo e Senhorio de Xavier, que remonta ao século XIII.
12/4/2007: Porto empresta códice raro de Vasco da Gama
A Câmara do Porto aprovou ontem a cedência temporária ao Museu Histórico Alemão, em Berlim, do códice "Roteiro da primeira viagem de Vasco da Gama à Índia", segurado em oito milhões de euros.
Outras notícias recentes:
Sesa Goa na mira de milionários 11/4/2007
Casa de Goa recebe diáspora em Junho 4/4/2007
Sub-15 goeses a caminho de Lisboa 2/4/2007
Vakil recandidata-se à Comunidade Islâmica de Lisboa 25/3/2007
Turismo de habitação com apoio português 22/3/2007
Museu do Oriente abre daqui a um ano 21/3/2007
Consultores europeus adoptam Índia 20/3/2007
Goa Bachao 17/3/2007
«O futebol goês precisa de uma revolução» 17/3/2007
Moldes indianos atraem atenção da CEFAMOL 14/3/2007
ÚLTIMA CRÓNICA:
11/4 - Opinião: The Uses and Abuses of All Things Portuguese
Um artigo de opinião que procura fazer um balanço sobre a herança portuguesa na Goa de hoje. Augusto Pinto divaga de forma descomplexada sobre as dimensões lusófonas da identidade goesa e sobre os principais debates que tal tem suscitado em vários quadrantes ideológicos.
Outras Crónicas recentes:
Newsletters AAPUI: Economia indiana eufórica 4/4/2007
Goa Eterna: A vida de Dom José Vieira Alvernaz 28/3/2007
Opinião: O caso de Goa (Palestra) 27/3/2007
Goa Eterna: Die Natter (A cobra) em Calangute 24/3/2007
Opinião: President of Portugal takes the Last Bus to Vasco 23/3/2007
ÚLTIMOS RECORTES:
Praias e igrejas fazem sucesso de Goa 21/3/2007
Goa Bachao 17/3/2007
Mariano Barreto lembra Goa 15/3/2007
Invasão de Goa foi «ilegal» para Azeredo 14/3/2007
Fortaleza com cocos e pé na água (Chaul, Korlai, Mandapeshwar) 8/3/2007
Conversa com vista para... Rosa Maria Perez 26/11/2006
Citações de Deli: João Mira Gomes
A nossa empregada
Sempre no fim
quinta-feira, 12 de abril de 2007
Trânsito matinal
quarta-feira, 11 de abril de 2007
O Glorioso não vem à Índia
Salem não larga Portugal
terça-feira, 10 de abril de 2007
Um avião e a nossa imagem
Lembrando-me desta notícia (EuroAtlantic Airways serve Air India) e encontrando esta afirmação de um passageiro de um dos aviões acidentados ("This Aircraft was 16 years old from Portugal"), parece confirmar-se a minha suspeita: o segundo avião (não este na fotografia) é um dos que a nossa EuroAtlantic Airways disponibilizou à transportadora aérea indiana recentemente. Salvo erro, vinha de Dubai (AI-736) e era um Boeing 767.
Assim, com negócios da China e aviões em terra (literalmente), a nossa imagem na Índia não vai longe. Para nosso bem, ainda bem que a imprensa indiana (ainda) não cobriu este assunto da proveniência dos aviões e as suas condições de segurança.
segunda-feira, 9 de abril de 2007
Aparanta, amanhã
Confiando: Mercado (tomates)
Confiando
domingo, 8 de abril de 2007
Aldrabando: Peso das uvas
Citações de Deli: Vir Sanghvi
India International Lalu no Hindustan Times de hoje
sexta-feira, 6 de abril de 2007
Orgulho hindu (Expresso)
Orgulho hindu
Nacionalismo: Jovens indianos de extrema-direita insurgem-se contra os divórcios, os hábitos alimentares importados do Ocidente, ou a vida nocturna das cidades, sinais de uma degeneração cultural. O Presidente Cavaco Silva foi um dos últimos alvos
"A Índia tem fama de ser fraca e obediente”, insurge-se Amit Singh, ao mesmo tempo que bebe um típico chá com leite, numa esplanada da Universidade Nehru, em Nova Deli. “Temos que descolonizar as nossas mentes e reafirmar a nossa superioridade cultural”, diz Ankita Battacharya, sentada ao seu lado.
Fundado em 1949 e actualmente com mais de um milhão de membros, o ABVP integra o Sangh Parivar, ‘a família das associações’ nacionalistas e extremistas de inspiração religiosa hindu de que faz parte o Partido Popular Indiano (BJP), que formou o Governo entre 1998 e 2004. Segundo Amit e Ankita, o ABVP procura consciencializar os jovens “para que não se envergonhem das suas raízes” num país que vive uma rápida ocidentalização dos seus costumes, desde o início das reformas económicas em 1991. O próprio chá que Amit bebe talvez seja das verdejantes plantações de Darjeeling, no estado do Assão, mas é produzido por uma multinacional suíça.
Da celebração do Dia de São Valentim e dos divórcios aos novos hábitos alimentares e à crescente vida nocturna na capital, é tudo visto como sendo sinal de uma “degeneração cultural”. Quase em coro, os dois insurgem-se: “Porque é que nos devemos envergonhar das nossas tradições?” Em vez disso, dizem querer “libertar os jovens de uma Síndroma de Estocolmo colonial e mostrar-lhes que a civilização indiana lhes oferece quase tudo”.
“Força é vida. Fraqueza é morte”
É por isso que o ABVP se considera uma organização “alerta” e se envolve muitas vezes em acções menos pacíficas. “O Hinduísmo é tolerante, mas quando nos provocam nós não perdoamos”, avisa Amit, referindo-se a casos em que dirigentes do ABVP recorreram à violência, principalmente “contra os comunistas que querem dividir o nosso país e contra os muçulmanos fanáticos e retrógrados”. A sua camisa, branca e cor de açafrão, ostenta uma imagem de Vivekananda, um célebre filósofo do século XIX, e a sua citação ‘Força é vida. Fraqueza é morte’.
Na montra de uma livraria, logo ao lado, vende-se o aqui muito lido ‘Mein Kampf’, de Adolf Hitler, por menos de cinco euros. “Está na hora de a Índia se afirmar como superpotência”, continua Amit, agora puxando pelos seus conhecimentos de política internacional e enumerando satélites, supercomputadores e taxas de crescimento para sustentar a sua afirmação. “Temos que ser mais agressivos na nossa política externa, porque o mundo deveria respeitar-nos mais”, lança, justificando assim também a capacidade nuclear que o país detém desde 1998. Ankita exclama logo «Akhand Bharat», o termo equivalente a Grande Índia, em hindi, sublinhando que “para mim, seria uma honra morrer pela Mãe Índia”.
A crescente popularidade do ABVP reflecte a enorme confiança que as novas gerações indianas estão a depositar no futuro do seu país. Segundo uma recente sondagem internacional, 96% dos jovens de Nova Deli sentem-se preparados para enfrentar o futuro, contra somente 45% em Nova Iorque e uma média mundial de 75%. Nos jornais e na televisão abundam os exemplos de jovens indianos cujo talento conquistou o mundo, como o da escritora Kiran Desai, da tenista Sania Mirza e de vários gestores empresariais na informática e nas ciências e tecnologias.
“Nós apoiamos a globalização e a vinda de multinacionais, desde que não eliminem os nossos valores”, refere Ankita, enumerando exemplos de amigas suas que vestem o tradicional sari nos call-centres internacionais e que, por isso, são olhadas de soslaio pelas colegas de calça de ganga. Amit lembra-se de um outro caso: “Num restaurante, é preciso falar em inglês para atrair a atenção dos empregados”. Repetem-se os exemplos, agora também de outros colegas que os rodeiam.
Constantino Xavier, correspondente em Nova Deli
NÚMEROS
1,3
milhões é a quantidade de militantes da “maior organização estudantil do mundo”, com mais de 4 mil núcleos
13
número de partidários “mártires”, vítimas do conflito com a guerrilha maoista no Centro do país até 1997
Inquisição e atropelo das liberdades
Na sequência dos protestos contra a atribuição de um doutoramento «honoris causa» da Universidade de Goa a Cavaco Silva, em Janeiro, Bharat Singh, dirigente nacional do ABVP, afirmou suspeitar que “alguns lusófilos se preparam para celebrar, em 2010, o quinto centenário da agressão portuguesa à Índia”, referindo-se à conquista de Goa, em 1510.
quinta-feira, 5 de abril de 2007
Paz sonora?
É o início do fim para a imensa poluição sonora rodoviária que flagela as cidades indianas. Por um lado, a paz é bem-vinda para uma melhor qualidade de vida. Por outro é, no entanto, o fim para toda uma cacofonia e orquestra rodoviária que tanto distinguem os espaços públicos indianos.
quarta-feira, 4 de abril de 2007
Citações de Deli: Abha Dawesar
Eleições municipais
segunda-feira, 2 de abril de 2007
Citações de Deli:
"The rise of the Bharatiya Janata Party in India and other religious and cultural fundamentalisms in the diaspora are unfortunate reminders that while we must work for and celebrate hybridity, we must also speak to the 'ethnic behaviour' that arises out of profound uncertainty and leads to a suspension of critical analysis."
Sandhya Shukla: "Building Diaspora and Nation: The 1991 Cultural Festival of India", Journal of Cultural Studies 11(2) 1997:296-315
World Toilet Summit 2007 em Nova Deli
"(The lavatories in Palam were literally covered with shit and the aerodrome officer could only speak of the shortage of staff i.e. sweepers). I wonder, wonder if the shitting habits of Indians are not the key to all their attitudes. I wonder if the country will not be spiritually and morally regenerated if people were only made to adopt the standards of other nations in this business of shitting; if only they could be made to see that they owe some responsibility to people—for this is what the Indian’s shitting habits explicitly deny. I am sorry to speak so much of shit, but my main emory of India is likely to be fear of shitting and shit—I cannot tell you what a luxury it is now to know that almost everywhere one goes one can be reasonably sure of clean bathrooms, and that this involves no degradation of anyone."
O World Toilet Summit realiza-se este ano em Nova Deli. É uma organização da World Toilet Organization: "A major world conference devoted to toilet provision and standards, the Summit sees delegates from all over the world attending conferences, experts’ forums, seminars, toilet exhibitions, network meetings and amazing toilet tours"