quarta-feira, 28 de março de 2007

A condição diaspórica e a sua crítica

É lançada amanhã a volumosa e muito completa obra (mais de 600 pp) de homenagem (Festschrift) à obra do Professor Teotónio de Souza, catedrático e director do Departamento de História da Universidade Lusófona, em Lisboa. Uma obra merecida para quem tanto tem trabalhado, de forma não poucas vezes polémica, o nosso passado, de Goa a Lisboa. Como não tive tempo para enviar um artigo académico, fiquei-me por um ensaio, incluído entre os vários tributos pessoais que constam da primeira parte. Aqui vão uns excertos.

Referência:
METAHISTÓRIA
Autor: Vários (org. Charles J. Borges, S. J. & Michael N. Pearson)
Nova Vega, Lisboa, 2007
Colecção: Documenta Historica/Série Especial


A CONDIÇÃO DIASPÓRICA E A SUA CRÍTICA (pp. 79-82)

Não é habitual um investigador júnior intrometer-se numa homenagem a um reputado académico sénior. À partida, reconheço, portanto, as minhas joviais limitações, agravadas pelo facto de eu me situar numa área disciplinar diferente da da História, que tanto tem merecido a atenção do Professor Teotónio de Souza. Mas é, talvez, justamente esta condição jovem que me faz merecer esta oportunidade, aliada ao facto de ambos partilharmos uma condição diaspórica goesa. O Professor uma de primeira geração e eu uma de segunda. É sobre esta condição diaspórica, e sobre a urgência da sua permanente crítica, que eu pretendo reflectir neste espaço.

(...)

A importância do trabalho e da carreira do Professor reside no facto de ele nos lembrar que a segunda face, a mais negra, nos acompanha constantemente. E fá-lo por via da crítica. Questionando a celebração, obriga-nos a voltar a pôr os pés em terra e a enfrentar a realidade, por mais que isso nos custe. Recorda-nos que a condição diaspórica que glorificamos é, em larga medida, fruto da nossa imaginação e o espelho dos nossos medos e das nossas ânsias identitárias. E urge-nos a interrogarmo-nos sobre as reais vantagens e desvantagens, bem como as oportunidades e os obstáculos, que rodeiam esta nossa condição.

É justamente aqui que se encontra a explicação pela hostilidade com que alguns sectores da nossa comunidade goesa, mas também da sociedade portuguesa em geral, têm recebido a valiosa obra e as reflexões do Professor. É natural – mas infeliz – que hostilizemos a voz dissidente e crítica, que nos obriga a repensar e a interrogar aquilo que sempre demos por adquirido. Mas, por mais que se tente, é impossível silenciar essa voz que o Professor adoptou para si. Porque essa voz, cheia de interrogações, reside naturalmente e intrinsecamente em toda e qualquer condição diaspórica. O Professor tem-se limitado a activá-la e resgatá-la da passividade a que a procuramos condenar no seio da nossa intimidade – pessoal, associativa ou comunitária. (...)

1 comentário:

  1. Muito bem, Constantino. Estou plenamente de acordo contigo. De tal forma o estou que vou pegar nestes excertos da tua comunicação e transcrevê-los no meu Travessa do Ferreira.

    Admiro muitíssimo o Prof.Teotónio de Souza - ainda que o não conheça pessoalmente. Mas, sendo casado com a Raquel, goesa praticante (o que já revelaste neste blog...) naturalmente que sigo as «coisas» do subcontinente - e em especial as que têm como tema o Estado de Goa, bem como as de Damão e de Diu.

    Desde a Sakuntala Miranda, escritora de mão cheia ao grande e saudoso Amigo Orlando Costa, desde o «malandro» do Mário Miranda, Mestre no cartoon e também meu Amigo do peito (que até já se deu ao desplante de me caricaturar) ao teu Pai Aurobindo, prof. e cientista e antigo vizinho de minha mulher nas Fontaínhas - a todos considero, a todos admiro, por todos tenho consideração e respeito.

    Mas quanto a Teotónio de Souza há uma peculiaridade: embora não nos conheçamos, como disse, estamos em consonância na maioria dos temas que ele superiormente aborda. Como é o caso, presumo, pela forma como o abordas.

    E já agora: deixa-te de «juniorices». Tu - ainda que puto, para mim - também és muito bom. A obra que fazes todos os dias é notável. Por isso te reproduzo no meu blog. Com a necessária reverência, mas com toda a alegria e satisfação. Como diria o Jô Soares - a juventude é um espanto!...

    PS (Que só quer dizer Post Scriptum...) - Desculpa-me o quilométrico deste comentário. Mas não me deste o número de caracteres porque eu não tos pedi, nem sabias que eu me iria abalançar a tanto...

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