sábado, 30 de setembro de 2006
No bolso
Amanhã de manhã - prometeu-me o dono da livraria no campus - tenho-o no bolso, por 850 Rupias e pronto para ser recenseado.
sexta-feira, 29 de setembro de 2006
Imagens de Deli: Benção
Atlântico: Swaraj
Passagem para a Índia (nº6)
SWARAJ
CONSTANTINO XAVIER EM NOVA DELI
(...) Por outro lado, deparamo-nos com uma causa mais tradicional, profunda e subconsciente, adequadamente representada pelo conceito “Swaraj” – a bandeira simbólica do movimento indiano pela independência. Nas palavras do nacionalista Chittaranjan Das (1870-1925), durante o Congresso Indiano de 1924, “Swaraj é mais do que a simples independência política e formal. É a independência de todos os obstáculos no caminho para a auto-realização”.
Num país que oferece terreno fértil para as teses do neo-colonialismo, o conceito de Swaraj permaneceu bem enraizado, simbolizando a preocupação indiana de se auto-realizar e desenvolver, independentemente de tudo e de todos. É uma Índia ciente de autonomia total, de liberdade de escolha máxima e de uma multiplicidade de opções infinita. Uma Índia com muitas relações amigáveis, mas com poucos amigos de verdade.
Engana-se, por isso, quem acha que a Índia, lá por ser democrática e falar inglês, vai cair “que nem um patinho” na órbita da águia norte-americana. Vislumbram-se provas contrárias, por todo o lado. Enquanto que as negociações sobre o acordo de cooperação civil nuclear e o “tu cá, tu lá” entre Nova Deli e Washington se arrastam há mais de um ano, está em pleno curso o Ano da Amizade Sino-Indiana, está iminente um acordo nuclear e militar com a França e Manmohan Singh não dispensa de telefonar ao iraniano Ahmadinejad, recordando-lhe que conta com o seu petróleo para daqui a uns anos. (...)
Excerto da coluna "Passagem para a Índia", do número de Outubro da Revista Atlântico. Nas bancas desde esta Quinta-feira passada.
SWARAJ
CONSTANTINO XAVIER EM NOVA DELI
(...) Por outro lado, deparamo-nos com uma causa mais tradicional, profunda e subconsciente, adequadamente representada pelo conceito “Swaraj” – a bandeira simbólica do movimento indiano pela independência. Nas palavras do nacionalista Chittaranjan Das (1870-1925), durante o Congresso Indiano de 1924, “Swaraj é mais do que a simples independência política e formal. É a independência de todos os obstáculos no caminho para a auto-realização”.
Num país que oferece terreno fértil para as teses do neo-colonialismo, o conceito de Swaraj permaneceu bem enraizado, simbolizando a preocupação indiana de se auto-realizar e desenvolver, independentemente de tudo e de todos. É uma Índia ciente de autonomia total, de liberdade de escolha máxima e de uma multiplicidade de opções infinita. Uma Índia com muitas relações amigáveis, mas com poucos amigos de verdade.
Engana-se, por isso, quem acha que a Índia, lá por ser democrática e falar inglês, vai cair “que nem um patinho” na órbita da águia norte-americana. Vislumbram-se provas contrárias, por todo o lado. Enquanto que as negociações sobre o acordo de cooperação civil nuclear e o “tu cá, tu lá” entre Nova Deli e Washington se arrastam há mais de um ano, está em pleno curso o Ano da Amizade Sino-Indiana, está iminente um acordo nuclear e militar com a França e Manmohan Singh não dispensa de telefonar ao iraniano Ahmadinejad, recordando-lhe que conta com o seu petróleo para daqui a uns anos. (...)
Excerto da coluna "Passagem para a Índia", do número de Outubro da Revista Atlântico. Nas bancas desde esta Quinta-feira passada.
Espaço
Leio, quase todos os dias, jornalismo em inglês, francês, espanhol e alemão. Por todo o lado há um tipo de texto chamado "feature", há novos estilos e novos formatos. Há espaço e inovação. Lê-se "we", "nous" e "wir" ou "I", "moi" e "ich" sem complexos. Há reportagem. Há olhares e perspectivas. E, depois, olho para Portugal e entristeco-me. Tenho 1001 ideias e poderia escrever, sem dificuldades, uma ou duas features por mês, mais um ou dois artigos mais específicos, sobre a actualidade. Mas, pura e simplesmente, não há espaço. Para quando, um grande diário ou semanário de referência, em Portugal? Culto, sóbrio e intelectual? Inovador, arejado e crítico?
quarta-feira, 27 de setembro de 2006
Greve de fome
Mais uma vez, o campus está em polvorosa. A JNUSU (Jawaharlal Nehru University Students Union) denunciou que a "Charter of Demands" apresentada à Administração (Reitoria) foi recusada em grande medida. Questão central: a reivinidicação estudantil de um aumento da bolsa "Merit-Cum-Means" (MCM) para todos os estudantes necessitados, de 800 para 1500 Rupias mensais (sensivelmente de 16 para 30 Euros). Medida adoptada: greve de fome. Primeiro rotativa ("relay", os estudantes participantes mudam de 24 em 24 horas). Agora contínua ("indefinite", os estudantes participam até serem hospitalizados à força pela polícia). Com o Vice-Chancellor (Reitor) por dez dias em Paris, prevêem-se muitas hospitalizações...
Óscar indiano?
Depois do alarido de "Lagaan", filme que chegou a ser nomeado em 2001 para os Óscares da Academia, agora é a vez de "Rang de Basanti". Ou melhor, poderá vir a ser a vez de, porque foi nomeado pelos indianos para uma nomeação.
O filme foca de forma soberba a transformação e os dilemas geracionais da Índia: tradição e modernidade, casta e classe, nação e mundo. A estrela Aamir Khan desempenha um papel excelente. O director, Om Prakash Mehra, rompe com o enredo clássico de Bollywood ao ponto de instigar directamente contra as autoridades estatais e premiar a audiência com um final... nada feliz.
Altamente recomendável para quem queira conhecer um pouco da Índia de hoje, dos jovens urbanos e da nova classe média que tantos arrepios está a provocar a Ocidente. Há dinheiro, há motas, há muito alcóol, há desinteresse pela história, mas há também conflitos de casta, de ideologia e de religião. Acima de tudo, no fim, há revolução.
O filme foca de forma soberba a transformação e os dilemas geracionais da Índia: tradição e modernidade, casta e classe, nação e mundo. A estrela Aamir Khan desempenha um papel excelente. O director, Om Prakash Mehra, rompe com o enredo clássico de Bollywood ao ponto de instigar directamente contra as autoridades estatais e premiar a audiência com um final... nada feliz.
Altamente recomendável para quem queira conhecer um pouco da Índia de hoje, dos jovens urbanos e da nova classe média que tantos arrepios está a provocar a Ocidente. Há dinheiro, há motas, há muito alcóol, há desinteresse pela história, mas há também conflitos de casta, de ideologia e de religião. Acima de tudo, no fim, há revolução.
segunda-feira, 25 de setembro de 2006
A globalização não pára nem perdoa
Thomas Friedman, no New York Times ("Anyone, Anything, Anywhere"):
"It turns out that many multinationals like the idea of spreading out their risks and not having all their outsourcing done from India — especially after one big U.S. bank nearly had to shut down last year when a flood in Mumbai paralyzed its India data center the same day a hurricane paralyzed its Florida operation. And there is no risk of nuclear war with Pakistan here. "When I first approached this big U.S. bank to outsource some of its services to Montevideo, instead of India," recalled Mr. Rozman, "the guy I was speaking with said, 'I don't even know where Montevideo is.' So I said to him, 'That's the point!' ".
"It turns out that many multinationals like the idea of spreading out their risks and not having all their outsourcing done from India — especially after one big U.S. bank nearly had to shut down last year when a flood in Mumbai paralyzed its India data center the same day a hurricane paralyzed its Florida operation. And there is no risk of nuclear war with Pakistan here. "When I first approached this big U.S. bank to outsource some of its services to Montevideo, instead of India," recalled Mr. Rozman, "the guy I was speaking with said, 'I don't even know where Montevideo is.' So I said to him, 'That's the point!' ".
Lançamento
É hoje, o lançamento de "In the Line of Fire", do militar e presidente paquistanês Pervez Musharraf. Muito aguardado. E muito polémico, tendo em conta as afirmações dos últimos dias, primeiro em Havana, depois em Washington. A imprensa indiana há dias que publica recensões e análises, estando alguns exemplares já em circulação em território indiano (mas não à venda, por enquanto). Isto tudo (Balochistão, "Acordo" com talibãs, movimentação de tropas ao longo da Caxemira, "bombardeamentos até à Idade da Pedra", mecanismos bilaterais anti-terrorismo etc. e tal) cheira-me a profundas mudanças tectónicas com epicentro na Ásia do Sul, muito em breve.
domingo, 24 de setembro de 2006
Chegou o Outono
Finalmente, depois de uma monção asfixiante em que a temperatura e a humidade se aliaram de uma forma verdadeiramente violenta e provocaram surtos de gripe viral por toda a cidade e pelo campus universitário (e cá em casa), chegou o ameno e agradável Outono deliense. Tudo a postos para seis deliciosos meses em termos climatéricos, com tempo seco, noites frias e dias solarengos.
sábado, 23 de setembro de 2006
Clássico
É clássico: há um golpe de estado militar na Tailândia e a imprensa portuguesa vai a reboque (de quem, ninguém sabe ao certo) e dá-lhe ampla cobertura. A questão não é a importância dos acontecimentos da semana passada em Bangequoque. A questão diz respeito aos critérios de selecção adoptados. Sempre o disse: é assombroso observar os critérios (ou melhor, a ausência deles) jornalísticos da comunicação social portuguesa em termos de política internacional.
Golpes de estado em repúblicas fantoche sul-americanas ou em autênticas zonas negras africanas (lembro-me da República Centro-Africana) são apresentados com grande alarido e desproporção. Entretanto, outras temáticas, muito mais relevantes e essenciais para a políticia internacional e porventura para Portugal, permanecem marginalizadas e, por consequência, na periferia do imaginário político, cultural e económico da sociedade. É óbvio que integro a Índia nesta última categoria, havendo, no entanto, dezenas de outros exemplos. Não é só clássico. É, simplesmente, assustador.
Golpes de estado em repúblicas fantoche sul-americanas ou em autênticas zonas negras africanas (lembro-me da República Centro-Africana) são apresentados com grande alarido e desproporção. Entretanto, outras temáticas, muito mais relevantes e essenciais para a políticia internacional e porventura para Portugal, permanecem marginalizadas e, por consequência, na periferia do imaginário político, cultural e económico da sociedade. É óbvio que integro a Índia nesta última categoria, havendo, no entanto, dezenas de outros exemplos. Não é só clássico. É, simplesmente, assustador.
Pão pão, queijo queijo
É nisto que dá a hibridez e a multiculturalidade. Uma tremenda esquizofrenia diaspórica que nos obriga a reconceber toda uma modernidade e todo um esquema conceptual e organizacional.
"Two Indians in Forbes list of richest Americans"
Como é? São indianos ou americanos? Como é?
"Two Indians in Forbes list of richest Americans"
Como é? São indianos ou americanos? Como é?
Jawaharlal Nehru University
Para quem está interessado em saber um pouco mais sobre a instituição que me acolhe nesta minha vida em Deli, bem como sobre a crescente tendência de estudantes ocidentais frequentarem cursos superiores na Índia, sugiro o seguinte artigo:
Jawaharlal Nehru University, or JNU as it is popularly known, is one of the most prestigious educational institutions in India which attracts students from all over the world. ... According to Professor Varun Sahni, advisor of foreign students at JNU, the university has become a hub for students from Europe in the past few years. He said: “As interest in India grows it has become an attractive destination for youngsters. There is a huge difference between coming here as a full-time student and taking a quick trip to India for a holiday.” In the academic year 2001-2002, JNU had 186 foreign students from 34 countries, many of them from Europe and the US and others from South-East Asia, Central Asia and Africa.
Jawaharlal Nehru University, or JNU as it is popularly known, is one of the most prestigious educational institutions in India which attracts students from all over the world. ... According to Professor Varun Sahni, advisor of foreign students at JNU, the university has become a hub for students from Europe in the past few years. He said: “As interest in India grows it has become an attractive destination for youngsters. There is a huge difference between coming here as a full-time student and taking a quick trip to India for a holiday.” In the academic year 2001-2002, JNU had 186 foreign students from 34 countries, many of them from Europe and the US and others from South-East Asia, Central Asia and Africa.
quinta-feira, 21 de setembro de 2006
À descoberta do mito Bangalore (Expresso)
No ‘Silicon Valley’ da Ásia, um grupo de MBA portugueses tomou o pulso à revolução indiana
“Contrastes”, “oportunidades” e “confiança”. Foi com estas palavras que os quarenta e três participantes portugueses do programa «Evolving Indian Business Environment», realizado este mês, no Indian Institute of Management de Bangalore (IIMB), descreveram a Índia e a sua economia emergente.
A iniciativa, inédita em Portugal, visa permitir anualmente aos alunos do MBA da AESE, Escola de Direcção e Negócios, “redescobrir uma nova Índia”, segundo Viassa Monteiro, professor na mesma instituição. “A distância psicológica que separa Portugal da Índia é bem maior do que a geográfica”, alerta, sublinhando que o objectivo é permitir aos alunos “observarem de perto o epicentro do crescimento económico indiano”. Bangalore, que na década de noventa cresceu a taxas superiores a 20%, é conhecida como o “Silicon Valley indiano”.
Foram, contudo, os contrastes socio-económicos que mais atraíram a atenção dos jovens profissionais portugueses. “Com 150 milhões de indianos a viverem em grande prosperidade, é um desafio gigante alargar a riqueza aos restantes 900 milhões”, diz Gabriel Abrantes, do planeamento estratégico da Sonaecom. “Está tudo por fazer”, refere, destacando os sectores dos serviços e das infra-estruturas.
Para Anabela Barata, os contrastes reflectem “tremendas oportunidades de investimento, com um crescimento sustentado e uma mão-de-obra qualificada e competitiva a nível global”. Contudo, para a consultora financeira, os desafios culturais e os obstáculos burocráticos e políticos exigem uma perspectiva a médio ou longo prazo. “Aqui não há espaço para ambições de lucro fácil”, assinala.
Luís Costa Afonso, gestor da Milefiore e importador de acessórios de moda da Índia, defende que a exploração do potencial indiano requer um comprometimento sustentado: “Não pode ser feito à distância. Implica conhecer o terreno e identificar nichos adequados às capacidades das pequenas e médias empresas portuguesas”, refere, salientando a importância de se conhecerem a cultura e as práticas locais de negócio.
Os elevados índices de confiança entre empresários, gestores e decisores indianos, foram um outro aspecto observado pelos participantes. Teresa Mesquita, profissional na área das tecnologias de informação, sublinha que estes “não se colocam à sombra do sucesso actual. Têm uma visão estratégica, racional e madura, o que surpreende num país saído de um longo período de paralisia e planeamento estatal”. O fenómeno também foi constatado no contexto académico. Quando inquirido sobre as estratégias a adoptar pela Europa para fazer face ao crescente poderio asiático, um dos professores do IIMB recusou-se a responder, explicando que “estamos a jogar pelas regras que vocês mesmo nos impuseram há três séculos”.
Para Narandra Agrawal, professor no IIMB, a atenção internacional de que Bangalore tem sido alvo é uma “mais-valia” para a inserção indiana na globalização. O instituto, que trabalha em rede com as escolas de negócio de Harvard nos Estados Unidos, McGill no Canadá e INSEAD em França, é considerado como uma “instituição de elite” na Índia. “Em termos de qualidade da educação estamos ao melhor nível mundial”, sublinha Agrawal.
Constantino Xavier, enviado a Bangalore
Caixa
200 multinacionais ocuparam boa parte das dezenas de parques tecnológicos. Entre directores executivos, técnicos e operadores são já mais de 15.000 os estrangeiros a viver em condomínios de luxo.
Até 2010 serão criados 120 mil novos postos de trabalho em «call-centers» para outras línguas europeias, que não o inglês.
30% dos agregados familiares de Bangalore possuem só uma bicicleta, enquanto que 9% possuem uma viatura ligeira, um jipe ou um monovolume.
Bangalore regista a sexta mais alta taxa de criminalidade entre as 35 megacidades indianas (com mais de um milhão de habitantes).
Mais de 200.000 jovens candidatam-se anualmente às 250 vagas oferecidas pelo Indian Institute of Management de Bangalore em cursos de pós-graduação.
Desde 2000, Bangalore atraiu em média cerca de 250 milhões de euros de investimento directo estrangeiro por ano, quase 8% do total indiano.
Por dia, Bangalore consome quase oito milhões de litros de água e produz cerca de três mil toneladas de resíduos sólidos.
O volume de tráfego rodoviário em Bangalore cresce a um ritmo anual de 7 a 10%, estando actualmente registados mais de 1,6 milhões de veículos motorizados.
"Em Directo"
Gabriel Abrantes, PLANEAMENTO ESTRATÉGICO SONAECOM
“1990 simbolizou um momento de ruptura, marcando o início da transição do planeamento socialista para a economia de mercado”
Anabela Barata, CONSULTORA FINANCEIRA
“Aos olhos europeus a pobreza é chocante, mas o crescimento fala por si e promete grandes transformações”
Luís Costa Afonso, GESTOR DA MILEFIORE
“A atitude dos empresários é quase fabril: não colocam dificuldades, assumem riscos e tornam tudo possível. Primeiro ouve-se um sim, depois um talvez e só raramente um não”
Nélson Rodrigues, ENGENHEIRO CIVIL
“Para um engenheiro civil há aqui negócios fabulosos para uma vida inteira”
Pedro Vasconcelos, ENGENHEIRO DE TELECOMUNICAÇÕES
“Ao fim de quinze anos de grande crescimento económico, em vez de o clima ser de euforia e arrogância, afirmou-se entre os indianos uma visão consciente, optimista e sóbria das suas capacidades e fraquezas”
Teresa Mesquita, COORDENADORA SIBS
“A visão estratégica das elites está ao nível europeu e norte-americano, fiel a uma constante introspecção e autocrítica”
O artigo, com mapa e fotografias, está disponível em linha no sítio do Expresso, esta semana com acesso gratuito (porque o sol apareceu no horizonte).
“Contrastes”, “oportunidades” e “confiança”. Foi com estas palavras que os quarenta e três participantes portugueses do programa «Evolving Indian Business Environment», realizado este mês, no Indian Institute of Management de Bangalore (IIMB), descreveram a Índia e a sua economia emergente.
A iniciativa, inédita em Portugal, visa permitir anualmente aos alunos do MBA da AESE, Escola de Direcção e Negócios, “redescobrir uma nova Índia”, segundo Viassa Monteiro, professor na mesma instituição. “A distância psicológica que separa Portugal da Índia é bem maior do que a geográfica”, alerta, sublinhando que o objectivo é permitir aos alunos “observarem de perto o epicentro do crescimento económico indiano”. Bangalore, que na década de noventa cresceu a taxas superiores a 20%, é conhecida como o “Silicon Valley indiano”.
Foram, contudo, os contrastes socio-económicos que mais atraíram a atenção dos jovens profissionais portugueses. “Com 150 milhões de indianos a viverem em grande prosperidade, é um desafio gigante alargar a riqueza aos restantes 900 milhões”, diz Gabriel Abrantes, do planeamento estratégico da Sonaecom. “Está tudo por fazer”, refere, destacando os sectores dos serviços e das infra-estruturas.
Para Anabela Barata, os contrastes reflectem “tremendas oportunidades de investimento, com um crescimento sustentado e uma mão-de-obra qualificada e competitiva a nível global”. Contudo, para a consultora financeira, os desafios culturais e os obstáculos burocráticos e políticos exigem uma perspectiva a médio ou longo prazo. “Aqui não há espaço para ambições de lucro fácil”, assinala.
Luís Costa Afonso, gestor da Milefiore e importador de acessórios de moda da Índia, defende que a exploração do potencial indiano requer um comprometimento sustentado: “Não pode ser feito à distância. Implica conhecer o terreno e identificar nichos adequados às capacidades das pequenas e médias empresas portuguesas”, refere, salientando a importância de se conhecerem a cultura e as práticas locais de negócio.
Os elevados índices de confiança entre empresários, gestores e decisores indianos, foram um outro aspecto observado pelos participantes. Teresa Mesquita, profissional na área das tecnologias de informação, sublinha que estes “não se colocam à sombra do sucesso actual. Têm uma visão estratégica, racional e madura, o que surpreende num país saído de um longo período de paralisia e planeamento estatal”. O fenómeno também foi constatado no contexto académico. Quando inquirido sobre as estratégias a adoptar pela Europa para fazer face ao crescente poderio asiático, um dos professores do IIMB recusou-se a responder, explicando que “estamos a jogar pelas regras que vocês mesmo nos impuseram há três séculos”.
Para Narandra Agrawal, professor no IIMB, a atenção internacional de que Bangalore tem sido alvo é uma “mais-valia” para a inserção indiana na globalização. O instituto, que trabalha em rede com as escolas de negócio de Harvard nos Estados Unidos, McGill no Canadá e INSEAD em França, é considerado como uma “instituição de elite” na Índia. “Em termos de qualidade da educação estamos ao melhor nível mundial”, sublinha Agrawal.
Constantino Xavier, enviado a Bangalore
Caixa
200 multinacionais ocuparam boa parte das dezenas de parques tecnológicos. Entre directores executivos, técnicos e operadores são já mais de 15.000 os estrangeiros a viver em condomínios de luxo.
Até 2010 serão criados 120 mil novos postos de trabalho em «call-centers» para outras línguas europeias, que não o inglês.
30% dos agregados familiares de Bangalore possuem só uma bicicleta, enquanto que 9% possuem uma viatura ligeira, um jipe ou um monovolume.
Bangalore regista a sexta mais alta taxa de criminalidade entre as 35 megacidades indianas (com mais de um milhão de habitantes).
Mais de 200.000 jovens candidatam-se anualmente às 250 vagas oferecidas pelo Indian Institute of Management de Bangalore em cursos de pós-graduação.
Desde 2000, Bangalore atraiu em média cerca de 250 milhões de euros de investimento directo estrangeiro por ano, quase 8% do total indiano.
Por dia, Bangalore consome quase oito milhões de litros de água e produz cerca de três mil toneladas de resíduos sólidos.
O volume de tráfego rodoviário em Bangalore cresce a um ritmo anual de 7 a 10%, estando actualmente registados mais de 1,6 milhões de veículos motorizados.
"Em Directo"
Gabriel Abrantes, PLANEAMENTO ESTRATÉGICO SONAECOM
“1990 simbolizou um momento de ruptura, marcando o início da transição do planeamento socialista para a economia de mercado”
Anabela Barata, CONSULTORA FINANCEIRA
“Aos olhos europeus a pobreza é chocante, mas o crescimento fala por si e promete grandes transformações”
Luís Costa Afonso, GESTOR DA MILEFIORE
“A atitude dos empresários é quase fabril: não colocam dificuldades, assumem riscos e tornam tudo possível. Primeiro ouve-se um sim, depois um talvez e só raramente um não”
Nélson Rodrigues, ENGENHEIRO CIVIL
“Para um engenheiro civil há aqui negócios fabulosos para uma vida inteira”
Pedro Vasconcelos, ENGENHEIRO DE TELECOMUNICAÇÕES
“Ao fim de quinze anos de grande crescimento económico, em vez de o clima ser de euforia e arrogância, afirmou-se entre os indianos uma visão consciente, optimista e sóbria das suas capacidades e fraquezas”
Teresa Mesquita, COORDENADORA SIBS
“A visão estratégica das elites está ao nível europeu e norte-americano, fiel a uma constante introspecção e autocrítica”
O artigo, com mapa e fotografias, está disponível em linha no sítio do Expresso, esta semana com acesso gratuito (porque o sol apareceu no horizonte).
Imagens de Deli: Paula & Ricardo
Já que estamos com a mão na massa - falando de portugueses em Deli - é urgente eu publicar esta fotografia, tirada há uns meses, na primavera. São a Paula e o Ricardo, dois mestrandos (numa área das ciências de que não me recordo) da Universidade do Minho. Tirando partido de uma rede de investigação conjunta com a Índia, obviamente financiada por Bruxelas, tiveram a bela ideia de vir ao reputado Indian Institute of Technology de Deli (IIT Delhi). Durante mais de seis meses pesquisaram em laboratórios sobre têxteis, com mais ou menos dificuldades ("é pá, eles não nos deixam trabalhar e só nos dizem para tirarmos férias!").
Embora vivessem noutra parte da cidade, ainda nos encontrámos várias vezes. Lembro-me, aliás, perfeitamente do dia em que o Ricardo me ligou pela primeira vez, a tratar-me por "senhor", contando-me que lhe tinham dado o meu número na Embaixada e que precisava de ajuda na procura de casa e "em geral".
Esta foto foi tirada num festival de gastronomia internacional na minha universidade, em que eles puderam saborear não um bom bacalhau, mas comidas de 1001 países de que só raramente se ouve falar. De Deli, um abraço para os dois, onde quer que agora estejam.
Embora vivessem noutra parte da cidade, ainda nos encontrámos várias vezes. Lembro-me, aliás, perfeitamente do dia em que o Ricardo me ligou pela primeira vez, a tratar-me por "senhor", contando-me que lhe tinham dado o meu número na Embaixada e que precisava de ajuda na procura de casa e "em geral".
Esta foto foi tirada num festival de gastronomia internacional na minha universidade, em que eles puderam saborear não um bom bacalhau, mas comidas de 1001 países de que só raramente se ouve falar. De Deli, um abraço para os dois, onde quer que agora estejam.
quarta-feira, 20 de setembro de 2006
Hoje acordei
Hoje acordei, cedinho de manhã, com o barulho de um canalizador a esfrangalhar a parede de uma das nossas casas-de-banho. Deve ter sido o senhorio a pedir a obra. Mas não tenho a certeza, é claro. Também não interessa.
Estudar história
He recollected that during the liberation struggle of Goa, the PCP’s clandestine magazine was the only one in Portugal to demand liberation for Goa. (...) "Like we supported the people of Goa then, we support the people of Palestine, Venezuela and Cuba now. We also support the workers and poor people of India. This visit is to exchange ideas toward that end", he said.
Palavras de Jerónimo de Sousa, secretário-geral do Partido Comunista Português, de visita a Goa. Convidado pelo CPI-M e CPI, os principais "sister-parties" comunistas da Índia, vai, conjuntamente com Ângelo Alves (Comissão Política), visitar também Deli e Calcutá.
O que me intriga, no entanto, é o seguinte: O que é que levou os comunistas portugueses a defenderem para o povo colonial de Goa uma "libertação" e uma "auto-determinação" diferente, se não antagónica, da exigida para todos os outros povos coloniais, da Guiné a Timor? Libertação, afinal, em que termos? Como soube o PCP presumir o que ia na mente dos goeses, se nunca houve um partido de libertação anti-colonial de massas, tal como o foi o Congresso na Índia Britânica ou o conjunto Frelimo/Renamo em Moçambique? Porque esta "excepção indiana", interpretando libertação como integração noutro país?
Terá sido por influência dos militares comunistas? Segundo Josep Sánchez Cervelló, historiador, havia no final da década de sessenta alguns militares do Exército português dispostos a receber directivas do Comité Central, estando estes “organizados desde os tempos de Goa coronéis do Exército, que tinham passado pela Índia como capitães, e que ali tinham vivido o pós-independência e contactado com o comunismo e com as ideias de libertação do Terceiro Mundo. Pessoas como Vasco Gonçalves, Varela Gomes ou Vicente da Silva”.
O que importa é saber se o Sr. Jerónimo tem a sua lição de história bem estudada e se é capaz de explicar e defender esta ambiguidade, mais de quatro décadas depois da integração forçada do Estado da Índia Portuguesa na União Indiana, e três décadas depois de o seu camarada Vasco Gonçalves ter chefiado o III Governo Provisório, cujo Ministro dos Negócios Estrangeiros (Mário Soares) assinou o tratado biliateral que reconheceu a soberania indiana sobre o território.
Até em termos de investigação, para as ciências sociais portuguesas, este é um mistério que deveria ser estudado melhor. Que siginificado, afinal, para a libertação?
PS: Com o apelido que tem, presumo que Jerónimo de Sousa já deve ter recebido, no seu quarto de hotel, uma dezena de telefonemas de velhinhas goesas tentando convencê-lo de que ele é um primo-neto-enteado "afastado" delas.
Palavras de Jerónimo de Sousa, secretário-geral do Partido Comunista Português, de visita a Goa. Convidado pelo CPI-M e CPI, os principais "sister-parties" comunistas da Índia, vai, conjuntamente com Ângelo Alves (Comissão Política), visitar também Deli e Calcutá.
O que me intriga, no entanto, é o seguinte: O que é que levou os comunistas portugueses a defenderem para o povo colonial de Goa uma "libertação" e uma "auto-determinação" diferente, se não antagónica, da exigida para todos os outros povos coloniais, da Guiné a Timor? Libertação, afinal, em que termos? Como soube o PCP presumir o que ia na mente dos goeses, se nunca houve um partido de libertação anti-colonial de massas, tal como o foi o Congresso na Índia Britânica ou o conjunto Frelimo/Renamo em Moçambique? Porque esta "excepção indiana", interpretando libertação como integração noutro país?
Terá sido por influência dos militares comunistas? Segundo Josep Sánchez Cervelló, historiador, havia no final da década de sessenta alguns militares do Exército português dispostos a receber directivas do Comité Central, estando estes “organizados desde os tempos de Goa coronéis do Exército, que tinham passado pela Índia como capitães, e que ali tinham vivido o pós-independência e contactado com o comunismo e com as ideias de libertação do Terceiro Mundo. Pessoas como Vasco Gonçalves, Varela Gomes ou Vicente da Silva”.
O que importa é saber se o Sr. Jerónimo tem a sua lição de história bem estudada e se é capaz de explicar e defender esta ambiguidade, mais de quatro décadas depois da integração forçada do Estado da Índia Portuguesa na União Indiana, e três décadas depois de o seu camarada Vasco Gonçalves ter chefiado o III Governo Provisório, cujo Ministro dos Negócios Estrangeiros (Mário Soares) assinou o tratado biliateral que reconheceu a soberania indiana sobre o território.
Até em termos de investigação, para as ciências sociais portuguesas, este é um mistério que deveria ser estudado melhor. Que siginificado, afinal, para a libertação?
PS: Com o apelido que tem, presumo que Jerónimo de Sousa já deve ter recebido, no seu quarto de hotel, uma dezena de telefonemas de velhinhas goesas tentando convencê-lo de que ele é um primo-neto-enteado "afastado" delas.
terça-feira, 19 de setembro de 2006
Póssobens simbólicos
Atenção que estes "póssobens" podem significar muita coisa (especialmente quando um dos intervenientes agarra o outro... pelo pulso!). Foi, aliás, em previsão deste mesmo "póssobem" que eu escrevi a minha coluna "Passagem para a Índia" que sai no número de Outubro da Revista Atlântico e é intitulada "Swaraj". Em finais deste mês nas bancas, ou nas caixas de correio dos assinantes.
sábado, 16 de setembro de 2006
A globalização do tali?
Sempre que vou a um dos restaurantes Saravana Bhavan (uma cadeia indiana com dezenas de restaurantes em vários países), para além de ficar deliciado com a comida vegetariana do Sul da Índia, fico convencido de que estamos mais próximos dos dias em que o mundo será menos ocidental. Daí não advém que será mais oriental. Mas será, certamente, menos ocidental e mais heterogéneo. As suas bases e os seus fundamentos, bem como a estutura, serão de cariz ocidental. Mas o conteúdo e a essência passarão a ser, mais e mais, autóctones, periféricos, creolizados ou misceginizados, entre o tribal e o cosmopolita. Tanto na gastronomia, como no pensamento académico ou na ideologia política.
quinta-feira, 14 de setembro de 2006
Soberania do sono
Para um ocidental na Índia não há episódio mais desconcertante do que ver um motorista de riquexó recusá-lo como passageiro só porque está no meio da sua soneca ou porque simplesmente não lhe apatece por o seu triciclo em circulação.
Há dezenas ou centenas de milhares de riquexós em Nova Deli e entre eles existe uma tremenda, e por vezes mesmo fratricida, rivalidade e competição. Um passageiro é quase como uma benção, especialmente um estrangeiro, pronto para ser enganado com uma volta extra ao bloco residencial ou uma infeliz viragem à esquerda quando a placa para o destino aponta para a direita. É também escusado lembrar que o quotidiano na Índia é uma batalha contínua pela sobrevivência de tons muito darwinistas. Quem não explora as oportunidades, arrisca-se a perder no grande jogo que é a economia indiana dos pequeninos.
Então, porque raio é que o motorista se recusa a fazer umas Rupias? Há ocidentais que, perante a recusa, ficam nervosos e irritados. Perante os incompreensíveis e negativos olhos dorminhocos do condutor, deixam-se levar pela frustração. É que ele nem perde tempo. Abriu os olhos, disse "não", e fechou-os novamente, de uma forma tão natural como se estivesse a despachar um charlatão à porta de casa.
Este é um daqueles mistérios interculturais que devem ser compreendidos e percebidos, mas não resolvidos. O ocidental, educado num sistema racionalista em que há um prestador de serviço e um consumidor respectivo em perfeita harmonia, encontra-se perante uma irracionalidade, logo "incompreensível". "Este homem não precisa de dinheiro para comer, para educar os filhos ou para a saúde e para tirar férias?", pergunta-se o ocidental, ainda mal refeito do susto e à procura de um outro riquexó.
Não. Aquele homem, naquele momento precisa de sono. Ou melhor, quer sono. Aquele condutor tomou uma decisão soberana: quero descansar e não me apetece prestar serviço a ninguém. É, mesmo dentro do contexto ocidental, uma decisão racional, calculada e pensada. Naquele momento, o condutor prefere estar parado e reunir esforços ou recuperar calma espiritual. Chamemos-lhe preguiçoso, irracional ou atrasado - não importa. Ele, como indivíduo, tomou uma decisão privada que em nada nos deve afectar (pois não se trata de um serviço público).
Na Escola Alemã, fartavam-se de nos contar a história do pescador mediterrânico que dormitava no seu barquinho e do turista alemão que lhe vinha enumerar as vantagens de trabalhar em vez de tirar a sesta: depois de um mês poderia comprar um segundo barco, pescava mais, vendia mais no mercado, fazia mais dinheiro, comprava uma traineira, pescava mais, empregava uns ajduantes, vendia mais, re-investia, e por aí adiante, até ser o dono de uma milionária frota pesqueira. "E depois?", irrompia o pescador latino, já chateado com tanto paleio germânico. "E depois", dizia o turista, "depois você é tão rico e tão poderoso que pode passar as tardes todas a dormitar à beira-mar". "Isso já o faço agora", retorquia o pescador e recomeçava a ressonar.
Não quero aqui romantizar em demasia a atitude do motorista (ou do pescador). É preciso valorizar o trabalho e é so com investimento e confiança que se mudam as condições miseráveis em que uma grande parte da população vive hoje. Se ele trabalhasse em vez de dormir à tarde, talvez tivesse umas Rupias a mais, ao fim do mês, para contratar um explicador para os filhos ou para, quando a mulher adoecesse, a levar a um hospital melhor.
Mas ele sabe isso e muito mais. Ele sabe o que é a batalha do quotidiano indiano. Quem somos nós para lhe darmos lições de economia e o forçar a interromper o seu sagrado e soberano sono?
Há dezenas ou centenas de milhares de riquexós em Nova Deli e entre eles existe uma tremenda, e por vezes mesmo fratricida, rivalidade e competição. Um passageiro é quase como uma benção, especialmente um estrangeiro, pronto para ser enganado com uma volta extra ao bloco residencial ou uma infeliz viragem à esquerda quando a placa para o destino aponta para a direita. É também escusado lembrar que o quotidiano na Índia é uma batalha contínua pela sobrevivência de tons muito darwinistas. Quem não explora as oportunidades, arrisca-se a perder no grande jogo que é a economia indiana dos pequeninos.
Então, porque raio é que o motorista se recusa a fazer umas Rupias? Há ocidentais que, perante a recusa, ficam nervosos e irritados. Perante os incompreensíveis e negativos olhos dorminhocos do condutor, deixam-se levar pela frustração. É que ele nem perde tempo. Abriu os olhos, disse "não", e fechou-os novamente, de uma forma tão natural como se estivesse a despachar um charlatão à porta de casa.
Este é um daqueles mistérios interculturais que devem ser compreendidos e percebidos, mas não resolvidos. O ocidental, educado num sistema racionalista em que há um prestador de serviço e um consumidor respectivo em perfeita harmonia, encontra-se perante uma irracionalidade, logo "incompreensível". "Este homem não precisa de dinheiro para comer, para educar os filhos ou para a saúde e para tirar férias?", pergunta-se o ocidental, ainda mal refeito do susto e à procura de um outro riquexó.
Não. Aquele homem, naquele momento precisa de sono. Ou melhor, quer sono. Aquele condutor tomou uma decisão soberana: quero descansar e não me apetece prestar serviço a ninguém. É, mesmo dentro do contexto ocidental, uma decisão racional, calculada e pensada. Naquele momento, o condutor prefere estar parado e reunir esforços ou recuperar calma espiritual. Chamemos-lhe preguiçoso, irracional ou atrasado - não importa. Ele, como indivíduo, tomou uma decisão privada que em nada nos deve afectar (pois não se trata de um serviço público).
Na Escola Alemã, fartavam-se de nos contar a história do pescador mediterrânico que dormitava no seu barquinho e do turista alemão que lhe vinha enumerar as vantagens de trabalhar em vez de tirar a sesta: depois de um mês poderia comprar um segundo barco, pescava mais, vendia mais no mercado, fazia mais dinheiro, comprava uma traineira, pescava mais, empregava uns ajduantes, vendia mais, re-investia, e por aí adiante, até ser o dono de uma milionária frota pesqueira. "E depois?", irrompia o pescador latino, já chateado com tanto paleio germânico. "E depois", dizia o turista, "depois você é tão rico e tão poderoso que pode passar as tardes todas a dormitar à beira-mar". "Isso já o faço agora", retorquia o pescador e recomeçava a ressonar.
Não quero aqui romantizar em demasia a atitude do motorista (ou do pescador). É preciso valorizar o trabalho e é so com investimento e confiança que se mudam as condições miseráveis em que uma grande parte da população vive hoje. Se ele trabalhasse em vez de dormir à tarde, talvez tivesse umas Rupias a mais, ao fim do mês, para contratar um explicador para os filhos ou para, quando a mulher adoecesse, a levar a um hospital melhor.
Mas ele sabe isso e muito mais. Ele sabe o que é a batalha do quotidiano indiano. Quem somos nós para lhe darmos lições de economia e o forçar a interromper o seu sagrado e soberano sono?
quarta-feira, 13 de setembro de 2006
Sul-Sul
Um eixo emergente a ter em conta no século XXI. Índia-Brasil-África do Sul, ou, IBSA (G3). Mete muita energia, comércio internacional, Embraers, um pouco de etanol, bastante África, muito Conselho de Segurança, e alguma cultura pelo meio.
"O presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o primeiro-ministro da Índia, Manmohan Singh, reafirmaram nesta terça-feira, durante encontro em Brasília, que os dois países querem estabelecer uma parceria estratégia e vão continuar atuando juntos em temas relacionados à Organização Mundial do Comércio (OMC) e à reforma do Conselho de Segurança da ONU. (...) Nesta quarta-feira, Lula recebe também o presidente da África do Sul, Thabo Mbeki, para a primeira reunião de cúpula do G3, criado em 2003 para promover a concertação política entre estes países e tentar aumentar a influência dos países em desenvolvimento."
"O presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o primeiro-ministro da Índia, Manmohan Singh, reafirmaram nesta terça-feira, durante encontro em Brasília, que os dois países querem estabelecer uma parceria estratégia e vão continuar atuando juntos em temas relacionados à Organização Mundial do Comércio (OMC) e à reforma do Conselho de Segurança da ONU. (...) Nesta quarta-feira, Lula recebe também o presidente da África do Sul, Thabo Mbeki, para a primeira reunião de cúpula do G3, criado em 2003 para promover a concertação política entre estes países e tentar aumentar a influência dos países em desenvolvimento."
Contrastes
Eu em algumas cadeiras tenho colegas que sabem mais do que muitos dos professores que eu já tive em Lisboa e Paris e, ao mesmo tempo, colegas que não sabem exprimir-se em inglês (chegam a intervir em hindi), nem escrever "research methodology" sem erros.
Andamos a despir-nos
Converso, ao almoço, com um ilustre amigo marxista-leninista meu e outros colegas. Falo sobre a tendência ocidental de procurar escapar ao peso, custo e burocracia do sistema judicial, encorajando-se o díalogo e as medidas alternativas (cordiais e extra-judiciais) de resolução de conflitos. Que, de certa maneira, isso representa um regresso ao passado pré-moderno e aos mecanismos e valores inter-individuais de resolução de conflitos, embora presuma a existência de uma plataforma democrática liberal comum a todos os cidadãos.
Responde-me o marxista-leninista: "Olha para eles. A propagarem a modernidade e o modelo burocrático, racional e legalista da justiça pelos quatro cantos do mundo, enquanto eles mesmo voltam ao tribalismo. Falta pouco e começam-se a despir todos e a andar nus por aí."
Responde um outro: "Já o andam a fazer há muito tempo, não reparaste?".
Responde-me o marxista-leninista: "Olha para eles. A propagarem a modernidade e o modelo burocrático, racional e legalista da justiça pelos quatro cantos do mundo, enquanto eles mesmo voltam ao tribalismo. Falta pouco e começam-se a despir todos e a andar nus por aí."
Responde um outro: "Já o andam a fazer há muito tempo, não reparaste?".
segunda-feira, 11 de setembro de 2006
Expresso: Como o medo mudou o mundo
O 11 de Setembro assemelhou-se a um sismo à escala global com epicentro em Nova Iorque e réplicas nos quatro cantos do mundo.
(...) Em 2006, foi a vez da Índia. A 11 de Julho passado, 1.200 pessoas morreram ou ficaram feridas nos atentados de Bombaim. Num país com grande diversidade étnica e religiosa - a sua Constituição reconhece 23 línguas oficiais -, com a segunda maior população muçulmana do mundo e com vários movimentos separatistas, a violência sempre fez parte do quotidiano dos indianos, mas nunca com a dimensão de há dois meses. Desde então, o país de Mahatma Gandhi vive em clima de alerta constante. A 15 de Agosto, feriado comemorativo da independência, o primeiro-ministro discursou em Nova Deli rodeado por atiradores e baterias antiaéreas e sobrevoado por helicópteros militares. Na recém-inaugurada rede de metro da capital, os produtos líquidos têm de ficar à superfície. E edifícios como o Parlamento ou o mítico Taj Mahal estão mais seguros do que nunca, rodeados por centenas de polícias e paramilitares. Bangalore, o «Silicon Valley indiano», onde operam várias multinacionais norte-americanas, vive em autêntico estado de sítio. E em milhares de cibercafés indianos, os utilizadores são obrigados a preencher um formulário com dados pessoais. (...)
Extracto da minha autoria, retirado do artigo maior "Como o medo mudou o mundo" publicado na edição de 9 de Setembro do Expresso, na revista Única.
(...) Em 2006, foi a vez da Índia. A 11 de Julho passado, 1.200 pessoas morreram ou ficaram feridas nos atentados de Bombaim. Num país com grande diversidade étnica e religiosa - a sua Constituição reconhece 23 línguas oficiais -, com a segunda maior população muçulmana do mundo e com vários movimentos separatistas, a violência sempre fez parte do quotidiano dos indianos, mas nunca com a dimensão de há dois meses. Desde então, o país de Mahatma Gandhi vive em clima de alerta constante. A 15 de Agosto, feriado comemorativo da independência, o primeiro-ministro discursou em Nova Deli rodeado por atiradores e baterias antiaéreas e sobrevoado por helicópteros militares. Na recém-inaugurada rede de metro da capital, os produtos líquidos têm de ficar à superfície. E edifícios como o Parlamento ou o mítico Taj Mahal estão mais seguros do que nunca, rodeados por centenas de polícias e paramilitares. Bangalore, o «Silicon Valley indiano», onde operam várias multinacionais norte-americanas, vive em autêntico estado de sítio. E em milhares de cibercafés indianos, os utilizadores são obrigados a preencher um formulário com dados pessoais. (...)
Extracto da minha autoria, retirado do artigo maior "Como o medo mudou o mundo" publicado na edição de 9 de Setembro do Expresso, na revista Única.
Atlântico: O espírito de Bombaim
Passagem para a Índia (nº6)
O ESPÍRITO DE BOMBAIM
CONSTANTINO XAVIER EM NOVA DELI
Tal como Nova Iorque, há cinco anos, também Bombaim terá que passar agora por um doloroso processo de cicatrização das feridas abertas pelo terrorismo. Mas o mais impressionante no pós-11 de Julho de Bombaim é que a vida continuou normalmente no dia seguinte ao horror, como se nada tivesse acontecido. É claro que num país em desenvolvimento, como a Índia, as pessoas não se podem dar ao luxo de faltar ao trabalho ou de passar a andar de táxi para escapar à violência de uns radicais pouco escrupulosos. Mas a realidade é que “Mumbai” provou ter aquilo de que Nova Iorque tanto se orgulhou após o colapso das Torres Gémeas. Aquilo a que se poderia chamar de espírito de uma megalópole global, tenaz e resistente.
(...) Para quem conhece a identidade de Bombaim e o estilo de vida dos seus cerca de quinze milhões de habitantes, não há nada a estranhar. A cidade tem um espírito tão dinâmico que pouco ou nada a consegue travar. Bombaim, talvez pela sua própria localização costeira, sempre foi uma cidade aberta ao mundo; um local de passagem, de conquista e de comércio para árabes, portugueses e ingleses. Bombaim pode não ser um “melting pot” por excelência, mas é um local onde diversas maneiras de estar na vida foram interagindo e negociando compromissos. É hoje uma imensa amálgama cultural e religiosa que inclui artistas parses zoroastrianos, comerciantes guzerates muçulmanos, médicos maratas hindus, varredores de rua intocáveis convertidos ao budismo e advogados goeses católicos. A sua própria geografia faz com que os raros motins étnicos e religiosos não passem de uma excepção à regra: a península, historicamente criada a partir de sete ilhas, reforça o sentimento de coesão e não permite fugir à coexistência pacífica.
Excerto da coluna "Passagem para a Índia", do número de Setembro da Revista Atlântico
O ESPÍRITO DE BOMBAIM
CONSTANTINO XAVIER EM NOVA DELI
Tal como Nova Iorque, há cinco anos, também Bombaim terá que passar agora por um doloroso processo de cicatrização das feridas abertas pelo terrorismo. Mas o mais impressionante no pós-11 de Julho de Bombaim é que a vida continuou normalmente no dia seguinte ao horror, como se nada tivesse acontecido. É claro que num país em desenvolvimento, como a Índia, as pessoas não se podem dar ao luxo de faltar ao trabalho ou de passar a andar de táxi para escapar à violência de uns radicais pouco escrupulosos. Mas a realidade é que “Mumbai” provou ter aquilo de que Nova Iorque tanto se orgulhou após o colapso das Torres Gémeas. Aquilo a que se poderia chamar de espírito de uma megalópole global, tenaz e resistente.
(...) Para quem conhece a identidade de Bombaim e o estilo de vida dos seus cerca de quinze milhões de habitantes, não há nada a estranhar. A cidade tem um espírito tão dinâmico que pouco ou nada a consegue travar. Bombaim, talvez pela sua própria localização costeira, sempre foi uma cidade aberta ao mundo; um local de passagem, de conquista e de comércio para árabes, portugueses e ingleses. Bombaim pode não ser um “melting pot” por excelência, mas é um local onde diversas maneiras de estar na vida foram interagindo e negociando compromissos. É hoje uma imensa amálgama cultural e religiosa que inclui artistas parses zoroastrianos, comerciantes guzerates muçulmanos, médicos maratas hindus, varredores de rua intocáveis convertidos ao budismo e advogados goeses católicos. A sua própria geografia faz com que os raros motins étnicos e religiosos não passem de uma excepção à regra: a península, historicamente criada a partir de sete ilhas, reforça o sentimento de coesão e não permite fugir à coexistência pacífica.
Excerto da coluna "Passagem para a Índia", do número de Setembro da Revista Atlântico
domingo, 10 de setembro de 2006
O mundo lusófono em curso em Deli
Dois anos depois, muitas propostas e projectos depois, materializa-se uma antiga ideia minha. No Sábado realizou-se a primeira de quinze sessões do curso livre "The Lusophone World: Social, Cultural and Political Aspects", na Universidade de Delhi, Faculty of Arts.
Coordenado pelo João Pedro Faustino (o leitor do Instituto Camões em Deli) e por mim, e apoiado pelo Department of Romance and Germanic Studies e pelo Centro de Língua, Instituto Camões-Goa, prolonga-se por quatro meses, até à cerimónia final em finais de Janeiro.
Com recursos mínimos pusemos em prática um projecto essencial para a diplomacia cultural (e não só) portuguesa por estas bandas. Um curso livre, em inglês (mas com elementos em português), sobre o mundo lusófono, com especial ênfase para a contemporaneidade. Moldado para estudantes, mas não só, interessados em conhecer mais desses oito países e centenas de comunidades lusófonas, num formato interactivo, com recursos audiovisuais e convidados.
Havendo tantos alunos da Delhi University e na minha Jawaharlal Nehru University a estudarem a língua portuguesa, presumimos que haveria interesse e resposta. Especialmente porque um outro objectivo é dar elementos e conhecimentos que os alunos depois poderão aplicar como mais-valia na sua futura carreira profissional como tradutores, intérpretes, guias, administrativos de embaixadas, etc.
Sábado de manhã, na primeira sessão (em que eu abordei a temática "A chronological background: Portugal and its major historical moments – from Afonso Henriques to Cavaco Silva"), estavam, nada mais, nada menos, do que 60 e tal participantes. Todos desejosos por saberem mais sobre a lusofonia, sobre Portugal, sobre o Adamastor, sobre o Brasil, sobre Lula da Silva, sobre Moçambique, sobre Mia Couto, ou sobre Goa e Timor. O programa completo está aqui.
Coordenado pelo João Pedro Faustino (o leitor do Instituto Camões em Deli) e por mim, e apoiado pelo Department of Romance and Germanic Studies e pelo Centro de Língua, Instituto Camões-Goa, prolonga-se por quatro meses, até à cerimónia final em finais de Janeiro.
Com recursos mínimos pusemos em prática um projecto essencial para a diplomacia cultural (e não só) portuguesa por estas bandas. Um curso livre, em inglês (mas com elementos em português), sobre o mundo lusófono, com especial ênfase para a contemporaneidade. Moldado para estudantes, mas não só, interessados em conhecer mais desses oito países e centenas de comunidades lusófonas, num formato interactivo, com recursos audiovisuais e convidados.
Havendo tantos alunos da Delhi University e na minha Jawaharlal Nehru University a estudarem a língua portuguesa, presumimos que haveria interesse e resposta. Especialmente porque um outro objectivo é dar elementos e conhecimentos que os alunos depois poderão aplicar como mais-valia na sua futura carreira profissional como tradutores, intérpretes, guias, administrativos de embaixadas, etc.
Sábado de manhã, na primeira sessão (em que eu abordei a temática "A chronological background: Portugal and its major historical moments – from Afonso Henriques to Cavaco Silva"), estavam, nada mais, nada menos, do que 60 e tal participantes. Todos desejosos por saberem mais sobre a lusofonia, sobre Portugal, sobre o Adamastor, sobre o Brasil, sobre Lula da Silva, sobre Moçambique, sobre Mia Couto, ou sobre Goa e Timor. O programa completo está aqui.
Imagens de Deli: Portugueses!
Dois anos depois, portugueses à vista. Eu já desconfiava, que nem Robinson Crusoe. Umas pegadas aqui e acolá. Um burburinho. Um pressentimento. E hoje confirmou-se. I am not the only one. Liga-me a Chanchal, aluna de português na Universidade de Deli, a avisar que se ia encontrar com "mais dois portugueses" e que eu estava convidado. Com uma hora e meia de atraso, lá chegaram os dois conterrâneos (tinham-se enganado no centro comercial).
Miguel Costa, que trabalha na Evalueserve, na área da análise económica e de gestão. É licenciado em Economia pela Universidade do Porto e está cá por um ano. Sónia Évora, que veio num estágio da AIESEC mas foi ficando, dando aulas de cultura portuguesa (pôs, numa escola, miúdos a dançar o malhão) e servindo como voluntária numa ONG. Licenciou-se na "minha" Faculdade de Ciências Sociais e Humanas (UNL) e chegou a especializar-se no "meu" curso de Relações Internacionais. Chegamos a tirar as mesmas cadeira e a partilhar alguns amigos, mas foi necessário virmos a Deli para travarmos conhecimento pessoal!
Os dois vivem em Gurgaon, a nova cidade-subúrbio a 30 km de Deli. A conversa estendeu-se por quase duas horas. Foi verdadeiramente bom partilhar experiências e conhecimentos. A Sónia volta no fim do mês a Portugal mas tanto que se integrou e apaixonou pela Índia que promete ("Eu sei que sim") voltar em breve. E parece que há um terceiro português, Vasco, a trabalhar para a IBM, igualmente em Gurgaon. Ficou, claro, combinado muita coisa para os próximos tempos (embora o Miguel seja "tripeiro" e portanto não será autorizado a integrar o Núcleo Benfiquista de Deli a que presido, de que sou fundador e actualmente sócio único - depois da saída co Chacate que liderava a subsecção moçambicana).
Finalmente, portugueses à vista em Deli. Sinal dos tempos?
Miguel Costa, que trabalha na Evalueserve, na área da análise económica e de gestão. É licenciado em Economia pela Universidade do Porto e está cá por um ano. Sónia Évora, que veio num estágio da AIESEC mas foi ficando, dando aulas de cultura portuguesa (pôs, numa escola, miúdos a dançar o malhão) e servindo como voluntária numa ONG. Licenciou-se na "minha" Faculdade de Ciências Sociais e Humanas (UNL) e chegou a especializar-se no "meu" curso de Relações Internacionais. Chegamos a tirar as mesmas cadeira e a partilhar alguns amigos, mas foi necessário virmos a Deli para travarmos conhecimento pessoal!
Os dois vivem em Gurgaon, a nova cidade-subúrbio a 30 km de Deli. A conversa estendeu-se por quase duas horas. Foi verdadeiramente bom partilhar experiências e conhecimentos. A Sónia volta no fim do mês a Portugal mas tanto que se integrou e apaixonou pela Índia que promete ("Eu sei que sim") voltar em breve. E parece que há um terceiro português, Vasco, a trabalhar para a IBM, igualmente em Gurgaon. Ficou, claro, combinado muita coisa para os próximos tempos (embora o Miguel seja "tripeiro" e portanto não será autorizado a integrar o Núcleo Benfiquista de Deli a que presido, de que sou fundador e actualmente sócio único - depois da saída co Chacate que liderava a subsecção moçambicana).
Finalmente, portugueses à vista em Deli. Sinal dos tempos?
India's new regional policy
Muito significativas, as afirmaçoes do Foreign Secretary Shyam Saran, numa palestra no Indian Council of World Affairs. Reflectem toda uma nova visão indiana para a região e uma grande mudança paradigmática, mais madura e estratégica. De "bully" a "patrono". Da força militar às "confidence-building measures" e à integração económica. O abandono do "tit-for-tat" e da condição da reciprocidade. É uma Índia generosa, regionalista e descentralizada que emerge na Ásia do Sul. Uma Índia que percebeu que, perante as manobras chinesas na vizinhança, só lhe resta o mesmo caminho: conquistar a região com muitos incentivos e mimos.
Em termos diplomáticos, académicos e na sociedade civil esta corrente de pensamento (a de "amaciar" as fronteiras e de integrar a região da Ásia do Sul) não é tão nova assim, no entanto. Está bem presente em alguns (minoritários) discursos diplomáticos mais recentes, de que Saran parece ser oriundo, está fortemente estabelecida na imprensa de referência, por via da revista Himal (Catmandu), e, no terreno, sempre foi uma realidade, como o próprio Saran admite, quando diz que se está ainda longe de reactivar os laços íntimos que ligavam as regiões fronteiriças indo-paquistanesas ou sino-indianas etc. antes de 1947. Para quem visita essas regiões, especialmente nos Himalaias, é muito óbvio que aquelas pessoas, aquela cultura e aquela economia estavam tradicionalmente muito mais ligada a Lhasa e ao Tibete do que a Deli, Calcutá e à Índia Britânica.
Mr. Saran said the treatment of the country's periphery as somehow less important than its heartland was a "relic of the past." Borders, he said, were connectors and that was why the government in recent years had made a conscious attempt to treat the country's border regions as integral to its foreign policy. "The sobering reality is that despite the initiatives of the past few years with Pakistan, Bangladesh, China, Myanmar and others, we have not even been able to get back to the connectivity which existed in South Asia before 1947," he noted.
Em termos diplomáticos, académicos e na sociedade civil esta corrente de pensamento (a de "amaciar" as fronteiras e de integrar a região da Ásia do Sul) não é tão nova assim, no entanto. Está bem presente em alguns (minoritários) discursos diplomáticos mais recentes, de que Saran parece ser oriundo, está fortemente estabelecida na imprensa de referência, por via da revista Himal (Catmandu), e, no terreno, sempre foi uma realidade, como o próprio Saran admite, quando diz que se está ainda longe de reactivar os laços íntimos que ligavam as regiões fronteiriças indo-paquistanesas ou sino-indianas etc. antes de 1947. Para quem visita essas regiões, especialmente nos Himalaias, é muito óbvio que aquelas pessoas, aquela cultura e aquela economia estavam tradicionalmente muito mais ligada a Lhasa e ao Tibete do que a Deli, Calcutá e à Índia Britânica.
Mr. Saran said the treatment of the country's periphery as somehow less important than its heartland was a "relic of the past." Borders, he said, were connectors and that was why the government in recent years had made a conscious attempt to treat the country's border regions as integral to its foreign policy. "The sobering reality is that despite the initiatives of the past few years with Pakistan, Bangladesh, China, Myanmar and others, we have not even been able to get back to the connectivity which existed in South Asia before 1947," he noted.
sábado, 9 de setembro de 2006
Eu já suspeitava
No último dia de palestras no Indian Institute of Managment, Bangalore (IIMB), os quarenta e tal estudantes de MBA da AESE (Escola de Direcção e Negócios, Lisboa) de visita à Índia, levaram com uma terapia de choque inédita e extremamente valiosa. Recebidos com imensa hospitalidade e profissionalismo numa das instituições de educação de elite, guiados pela cidade que é conhecida como o "Silicon Valley indiano", mimados com palavras bonitas e afirmações moderadas, de repente, do nada, emergiu uma opinião que - já suspeitava eu - está bem enraizada na psique indiana.
Um dos MBAs pergunta a um dos professores quais seriam, na opinião dele, as medidas mais adequadas para as empresas portuguesas e europeias responderem à ofensiva da internacionalização das empresas indianas e à fuga de empregos para a Índia. Responde o académico, num perfeito inglês e sem margem para dúvidas:
"We have absolutely no sympathy for you, because you have been doing this to us for 300 years. We are playing by the exact same rules you taught us and imposed on us".
Se os estudantes e jovens profissionais portugueses tiraram uma única lição da sua vinda à Índia, é esta: há muita confiança e bastante rancor.
Um dos MBAs pergunta a um dos professores quais seriam, na opinião dele, as medidas mais adequadas para as empresas portuguesas e europeias responderem à ofensiva da internacionalização das empresas indianas e à fuga de empregos para a Índia. Responde o académico, num perfeito inglês e sem margem para dúvidas:
"We have absolutely no sympathy for you, because you have been doing this to us for 300 years. We are playing by the exact same rules you taught us and imposed on us".
Se os estudantes e jovens profissionais portugueses tiraram uma única lição da sua vinda à Índia, é esta: há muita confiança e bastante rancor.
Servidores e bloggers
Isto, desde os atentados de Bombaim, está pior e pior. Agora também me afectou a mim. Sabe-se lá porquê, mas os gatunos cibernéticos aqui do bairro (que detêm o monopólio do serviço para esta parte da cidade) mudaram-me para outro servidor. E, de repente, deixei de poder aceder aos sites blogspot.com e de enviar mensagens via Outlook. Depois de umas investigações em sites de "nerds" descobri que, por ordem do Governo indiano, vários portais de bloggers e mesmo o Yahoogroups foram parcialmente interditos em solo indiano. Para voltar a relatar-vos a vida em Deli, imaginam certamente a dor de cabeça que foi reverter o processo e voltar ao servidor antigo. Felizmente, tudo correu bem, e cá estou eu, com mais ou menos atentados.
domingo, 3 de setembro de 2006
Imagens de Deli: Jama Masjid
A mesquita central de Deli, a Jama Masjid, domina a Velha Deli e os seus animados bazaars. É a maior mesquita na Índia e provavelmente uma das maiores fora do Médio Oriente. Na fotografia, tirada do cimo de uns dos seus dois minaretes, vê-se, ao fundo, o imponente Forte Vermelho (Lal Quila). É do seu Portão Lahore (no extremo esquerdo da fotografia) que Jawaharlal Nehru declarou a independência da Índia à meia-noite do dia 15 de Agosto de 1947, enquanto que hindus e muçulmanos se cruzavam e chacinavam ao longo da nova fronteira indo-paquistanesa. É do Lahore Gate que discursa, todos os anos, o primeiro-ministro da Índia, durante as comemorações do Dia da Independência (Independence Day).
Portugal em Bangalore
Estou de volta à Índia. Acabei de aterrar ontem à noite m Deli, vindo de ... Bangalore! Não. Bangalore ainda não se tornou num verdadeiro Silicon Valley e em mais uma "Goa", ou seja, uma ilha quase estrangeira em solo indiano.
Estive em Bangalore, no Indian Institute of Managment, a acompanhar a visita do grupo de estudantes do MBA Executivo da AESE, Escola de Direcção e Negócios, Lisboa. 40 e tal portugueses numa autêntica redescoberta da Índia, tanto perante os professores de gestão indianos no anfiteatro, bem como perante os mendigos e pedintes na rua. Um excelente porgrama de uma semana coordenado pelo Prof. Viassa Monteiro (como sempre, um goês a fazer a ponte entre Ocidente e Oriente), com oradores muito reputados e visitas a empresas e indústrias de grande relevância para o futuro da economia... portuguesa.
Acima de tudo, os participantes trouxeram consigo um pouco de Portugal. Para bem e para mal, mas soube-me bem beber um pouco de Portugal em Bangalore. Em especial, em conversas e observações, permitiu-me olhar de novo para a Índia com a mente virgem e pura, como se fosse a minha primeira vez também.
Estive em Bangalore, no Indian Institute of Managment, a acompanhar a visita do grupo de estudantes do MBA Executivo da AESE, Escola de Direcção e Negócios, Lisboa. 40 e tal portugueses numa autêntica redescoberta da Índia, tanto perante os professores de gestão indianos no anfiteatro, bem como perante os mendigos e pedintes na rua. Um excelente porgrama de uma semana coordenado pelo Prof. Viassa Monteiro (como sempre, um goês a fazer a ponte entre Ocidente e Oriente), com oradores muito reputados e visitas a empresas e indústrias de grande relevância para o futuro da economia... portuguesa.
Acima de tudo, os participantes trouxeram consigo um pouco de Portugal. Para bem e para mal, mas soube-me bem beber um pouco de Portugal em Bangalore. Em especial, em conversas e observações, permitiu-me olhar de novo para a Índia com a mente virgem e pura, como se fosse a minha primeira vez também.
Subscrever:
Mensagens (Atom)