Um artigo meu virado mais para o mundo empresarial português, publicado no Jornal de Negócios de 10 de Janeiro.
Portugal visto da Índia
Constantino Xavier*
Finalmente, com um atraso de vários anos, também Portugal acordou para a necessidade de redescobrir a Índia, quinhentos e sete anos depois de Vasco da Gama. Prova-o a visita oficial que Cavaco Silva presta, a partir desta Quinta-feira, a uma economia que, daqui a menos de trinta anos, deverá ser a terceira maior do mundo.
Mas, tendo em conta a experiência dos raros empresários e investidores lusos que por aqui se têm aventurado, são inúmeros os obstáculos que ainda se nos colocam, no terreno.
Em termos populacionais, a Índia é cem vezes maior do que Portugal (só Bombaim tem quase vinte milhões de habitantes) e as disparidades entre o arcaico mundo rural e as cosmopolitas bolsas urbanas são gritantes. As práticas de negócio são condicionadas pelo sistema de casta hindu, pela estrutura política federal (28 estados e 604 distritos) e pela grande diversidade religiosa (maior minoria muçulmana do mundo) e linguística (23 línguas oficiais). Há que enfrentar ainda a titânica burocracia e a endémica corrupção (os índices são recordistas a nível internacional), bem como o crónico subdesenvolvimento infra-estrutural (cortes de energia são frequentes, até na capital).
Se todas estas dificuldades podem, de uma maneira ou outra, ser ultrapassadas com o apoio de parceiros locais, um aspecto permanece, no entanto, central ao sucesso português na Índia. É o da nossa imagem naquele país. Por um lado, Portugal goza de um imenso (e, por enquanto, subaproveitado) capital de simpatia, especialmente em áreas de influência histórica portuguesa, como o são Goa, Damão e Diu, onde Portugal representa uma poderosa imagem de marca e um símbolo de prestígio para o consumidor.
Contudo, essa mais-valia sentimental limita-se a pequenos nichos territoriais, insignificantes ao nível nacional. Nas metrópoles indianas – os motores do consumo e crescimento económico – a imagem de Portugal é, pura e simplesmente, inexistente. Não é raro persistir a imagem de um Portugal subdesenvolvido, isolado e conservador. Para os indianos o azeite pode ser espanhol, a tecnologia belga, a engenharia espanhola, os aviões brasileiros e o vinho chileno e australiano. Português, talvez só o Figo e o Ronaldo, embora nem o futebol nos sirva de porta de entrada para um país em que reina o críquete.
Para todos os efeitos, Portugal situa-se na periferia do imaginário internacional da classe média indiana e é esse o principal obstáculo ao sucesso dos nossos empresários que, por sua vez, também sofrem os efeitos nefastos da pobre imagem que prevalece da Índia em Portugal, dissuadindo-os de explorar as grandes oportunidades que nos oferece a “nova Índia”, no “século da Ásia”.
É neste contexto sombrio que a visita presidencial a Nova Deli, Goa, Bombaim e Bangalore se afigura como uma excelente oportunidade para que se refresquem imagens mútuas e se identifiquem novos nichos e oportunidades, a Oriente e a Ocidente.
*Investigador, Universidade Jawaharlal Nehru, Nova Deli
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