quarta-feira, 30 de abril de 2008

Redescobrindo: Nóida e Iamuna

Ora cá está uma terra que praticamente não precisa de nenhuma adaptação gráfica para ser escrita e pronunciada correctamente em português. O imenso subúrbio de Noida, do outro lado do rio Yamuna, foi criado nos anos setenta e é (poucos o sabem) uma simples sigla para New Okhla Industrial Development Area (NOIDA). Não há portanto nenhuma peculiaridade histórica e linguística na criação deste nome pela burocracia indiana anglófona.

No entanto, os nativos de hindi (especialmente os motoristas de riquexó que, para mim, são um excelente critério para aceder à pronúncia autóctone mais típica) gostam de enfatizar a primeira sílaba e a primeira vogal. Assim, tendo em conta que um simples Noida seria provavelmente lido, por muitos portugueses, como um o fechado (como se fosse Nôida), proponho Nóida, que é a versão exacta do que se pronuncia nas ruas de Deli.

Já agora, como falamos no rio, é natural que o agora pouco majestoso rio Yamuna (muitas vezes aqui pronunciado como Yamna, Jamuna or Jamna) deve ser escrito Iamuna em português (tal como aqui), devendo resistir-se à nossa natural tentação de enfatizar a terceira sílaba (Iamúna).

Assim, Nóida, um subúrbio industrial de Nova Deli, fica do outro lado do rio Iamuna. Mas, como sempre, aceito críticas, correcções e sugestões para afinar esta série e passarmos a escrever a Índia com mais correcção.

11 comentários:

  1. E todo esse esforço, Constantino, em pleno alvoroço sobre o acordo ortográfico?!
    ;-)

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  2. É verdade, Gi. Mas acho que é muito importante. A forma displicente como escrevemos a Índia reflecte a nossa falta de conhecimento e interesse por este imenso e muito importante país (e também desrespeito pelas regras actuais que orientam a nossa língua).

    E sabe, o interessante é que os brasileiros e outras grafias lusófonas (a da imprensa angolana, em particular) vão muito à nossa frente neste aspecto.

    Não estou muito informado (nem interessado) no debate sobre o novo Acordo, mas acho que ele irá necessariamente acabar por premiar esforços como este da minha série "Redescoberta" e denunciar os puristas e displicentes que continuam a minar a língua portuguesa em Portugal.

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  3. Que tal Iamena? Estes us que aparecem na anglicização de outras línguas são com frequência «âs» e não «us». Iamna não dá porque muita gente vai pronunciar Iãmna. Também pode ser Iâmuna.

    Como tu, passo ao lado das questões de especialistas e procuro lidar com estes assuntos à boa maneira de antigamente.

    Sérgio

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  4. Neste caso, Sérgio, se bem me lembro o u é mesmo u, não é, Constantino?

    Eu também não conheço bem o acordo e tento escrever o mais correctamente possível segundo as regras que aprendi/tenho aprendido (algumas coisas já se têm modificado pelo caminho).

    A transliteração de nomes estrangeiros tem-me ocupado sobretudo em relação ao latim. Por exemplo, deve-se traduzir Tremellius Scrofa por Tremélio Escrofa? Ou por Tremélio Porca, que parece ser o significado de Scrofa?

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  5. Cuidado que estás-te (aliás, agora é «estáste») a meter num campo minado. A lusitanização de nomes orientais passa porque não há especialistas nas nossas paragens. Agora mexeres no latim pode ser um grande risco porque aí há-os. Devo dizer que Porca tem muito mais piada, mesmo que não seja uma transliteração mas uma tradução (ao que dizes que para mim o latim é grego).

    Mas estas coisas da transliteração têm piada. Por exemplo, é sempre de rir quando nos atiram à cara as «más» transliterações para português de nomes indianos (tipo, «it's not Panjim, it's Paneji or Ponejê» - nota que tive de transliterar para ser compreensível na nossa língua), dizia eu, é de rir quando as pessoas que o fazem são absolutamente incapazes de pronunciar um nome luso em algo que passe minimamente por português, normativo ou não normativo...

    Sérgio

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  6. Alto! As minhas desculpas, estava a responder à pessoa errada. Coisas da net.

    Sérgio

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  7. Mas quanto à questão do u ser mesmo u. Há uma hipótese que me coloco de há muito e que nunca pude esclarecer mas que é a seguinte:

    A Índia foi dominada pelos ingleses ao longo de dois séculos. Esse domínio foi realizado por contingentes militares idos das ilhas britânicas. Como é evidente, estes estavam longe de representar o círculo que rodeava a rainha de Inglaterra. Havia contingentes de ingleses - normalmente dos escalões mais«populares» -, de escoceses, de irlandeses, etc. Como é evidente, os indianos aprenderam o inglês com os britânicos que lhes caíram em sorte.Ora é bem sabido que a pronúncia do inglês é bem mais variada do que o português.

    Daí a minha hipótese: cada canto do império britânico aprendeu a falar mal o inglês de acordo com o semi-analfabeto que lhe caiu em sorte. (Mal, é evidente, do ponto de vista da excelsa rainha). E quem diz falar diz escrever.

    Portanto, Yamna, Yamuna, etc.? Há que ir ver de onde vinham os contigentes militares que apropriaram o pobre do rio para o império.

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  8. Em primeiro lugar peço desculpa ao Constantino, e espero que não se importe que tenhamos apanhado boleia na sua caixa de comentários :-)

    Em segundo lugar, a história do u: eu julgo ter ouvido indianos dizerem Iamuna com u mas posso estar enganada. lembro-me também de ter ouvido chamar Uaransi a Varanasi = Benares :-)

    Em terceiro lugar: tem razão, Sérgio, eu expliquei-me mal, a minha dúvida no latim é precisamente entre a transliteração e a tradução.

    Finalmente: obrigada a ambos :-)

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  9. O problema é que os próprios indianos não são de fiar. Veja-se o caso de Panjim. «Panjim» é a versão portuguesa do que seria em concanim algo como «Pongê». Acontece que nas línguas indianas não há a nasalisação final, esta de influência portuguesa, o que se tornou muito ofensivo para os nacionalistas de há umas décadas. Daí após a invasão indiana a necessidade de uma nova transliteração do nome.

    Saiu em sorte a de influência marata, Panaji. Foi pior a emenda do que o soneto. Hoje é frequente aos indianos não goeses dizerem assim mesmo, «Pânâjí», o que é a criação de raiz de um novo nome para a cidade. Ou a portugueses que deveriam estar mais bem informados chamarem-lhe «Panáji»...

    Na Índia actual continua a fúria re-nomeadora. Depois de Varanasi, Kolkata, Mumbai, Panaji, Kozikode, Thiruvanatampuram, Chennai, veio a vez de Puducheri e Bengaluru (nestes últimos casos posso ter cometido erros na escrita dos nomes).

    Por mim acho que nos devemos ater aos nomes portugueses ou transliterar de forma correcta em termos do português. O pior mesmo é cairmos na confusão total como as tvs que na corrente crise no antigo Pegu alternam alegremente entre Birmânia e Myamar.

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  10. É Panaji ! Acabou-se, só cá faltavam os estrangeiros discutirem qual o caminho que os indianos devem tomar ou os nomes a escolher.
    A colonização acabou há décadas, meninos.
    Vamos mas é resolver os nossos problemas como este, meio milhão de desempregados.
    Marlene.

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  11. Que debate interessante que por aqui se desenvolveu! Ainda bem, é sinal de que a redescoberta da Índia não só se está a fazer com muito interesse, mas introspecção crítica também.

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