quarta-feira, 15 de setembro de 2004

Jogos olímpicos

Na senda do orgulho ferido indiano que analisei anteriormente, faz sentido observar a cobertura que a imprensa indiana deu aos Jogos Olímpicos. Para rematar desde já a Índia para a cauda das caudas, o país ficou em último lugar na classificação que analisa os desempenhos dos países em relação à sua população. Uma medalha de prata na modalidade de tiro foi o que um militar indiano conseguiu nos jogos desportivos mais importantes do globo.

Os jornais passaram semanas a publicar cartas de leitores, editoriais e colunas de opinião sobre o assunto, reflectindo a profunda falta de confiança e insegurança complexada dos indianos, até neste pacífico capítulo desportivo. Tudo rodava à volta da interrogação geral How does a nation of one billion people just achieve one silver medal in the Olympic Games? Países como a Lituânia, o Sudão e o Luxemburgo acabaram à frente desta auto-proclamada futura superpotência mundial.

Contudo, o mais curioso foi observar a construção e propaganda nacionalista à volta do desempenho desportivo. Os jornais de referência chegaram a publicar títulos como "Go get them George!!" na primeira página, seguindo a linha britânica da imprensa nacionalista e trauliteira. No caso do salto em cumprimento feminino, houve uma indiana que chegou à final. Nos dias anteriores à final os diários vinham infestados de páginas inteiras sobre a atleta, apresentando-a como uma atleta de nível mundial com grandes possibilidades de trazer uma medalha para Nova Deli. A questão foi amplamente politizada com comentários de políticos na esperança de retirarem dividendos de um potencial sucesso.

Mas será que todos são cegos neste país? Ou a febre nacionalista é assim tão poderosa? A atleta, Anju George, tinha um recorde pessoal inferior em mais de meio metro (!) em relação a quase todas as outras finalistas. A prova que a táctica funciona, é que até eu, confrontado com os números, acreditava que a atleta teria mesmo hipóteses e cheguei a comentar o facto positivamente com colegas indianos. Só reparei no ridículo quando um amigo francês comentou o assunto incrédulo. Anju ficou em última.

Deliciem-se com estas cartas ao editor no The Hindu, jornal de maior referência na Índia (ênfases meus):

"Sir, besides acquiring physical fitness, our sportspersons need to get mentally though. We had a number of clear near misses at the Athens Olympics with some of our participants finishing within the top eight." Sohan G John, Allappuzah, Kerala

"Sir, India's performance should not surprise us because as a nation we lack pride. We also have the uncanny knack of drowning the sorrow monumental defeats in the ocean of rejoicing we do for the tiniest of victories. (…) but let us not get intoxicated by this victory that we cease to feel the pain of our much larger defeat." S.A.R. Adil, Bangalore

"Sir, Unless we reach the top 10 in the medals tally we should not even think of organising the Olympics (O Governo indiano pensa numa candidatura). Going by our performance of a medal every four years, it should be around 500 years from now."

1 comentário:

  1. nem de propósito: ainda um dia destes vi o making of de um filme, em q a história se passava num palácio na india. ora, por "orgulho nacionalista" - expressao do actor indiano q participava - quiseram as autoridades indianas alterar o guião do filme ao seu gosto, nao fosse haver qq critica aos indianos. resultado: acabou por ser filmado no sri lanka!! o filme era o Indiana Jones: Temple of Doom

    gonçalo ( o benfica tá a bombar tino)

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