quarta-feira, 29 de junho de 2005
Partida
Estou de partida, daqui a poucas horas, depois de algumas semanas de volta a Lisboa. Amanhã de manhã os 40ºC e tal me darão as boas-vindas no Indira Gandhi International Airport em Nova Deli. Se tudo correr bem daqui a uns dias inicio a minha "expedição" para o Ladakh. Podem cheirar em http://ladak.free.fr/. Aguardo a vossa tão esperada visita. Até já!
domingo, 26 de junho de 2005
Calma rodoviária (caos e ordem)
Há por aí um vídeoclip a circular na Internet em que é filmado um cruzamento numa grande metrópole asiática em que reina o caos total. Entre pessoas, bicicletas, tricicletas, motas, vespas, carros, camiões e autocarros há de tudo um pouco, menos ordem. Para além do facto de o vídeo ser engenharia (magia) informática de um miúdo ocidental qualquer decidido a reforçar ainda mais o fascíneo por um Oriente exótico-incompreensível, as imagens confirmam a nostalgia.
Estive na presença de umas poucas pessoas quando viam o vídeo e ouvi mais algumas comentar sobre ele. Primeiro, poucos se apercebem que aquilo é mera fotomontagem. Segundo, em tom de D. Gracinda que relata um acidente catastrófico ali na esquina do café, submetem-se totalmente ao incompreensível - o que é compreensível porque simplesmente é inexistente. Terceiro, paira no ar um misto de admiração e nostalgia.
O meu pai conta que nos anos 60, quando estudava na Alemanha, se encontrava hospitalizado num quarto com vista para um cruzamente com semáforos. Sempre que estes deixavam de funcionar, o que acontecia com alguma regularidade, ouvia imediatamente ou assistia ao vivo a acidentes rodoviários porque os condutores alemães não sabiam reagir perante a demissão da autoridade suprema semaforária.
Utilizei um exemplo alemão porque me parece mais constrastante com a experiência indiana. Portugal encontra-se no meio. Portanto, em termos ocidentais, a ordem tornou-se um pouco numa obsessão - se me permitem. A ordem, a disciplina e o formalismo em excesso levam à decadência moral, tal como a excessiva dependência do material que nos rodeia mais do que nunca. "Só um Sith pensa em extremos" como me avisa um amigo, parafraseando um boneco de cinema.
Voltando ao cruzamento, há nostalgia, porque há incapacidade ocidental de voltar ao caos primordial - não necessariamente bom, sublinho. Na Índia sobrevive. Os cruzamentos, os semáforos, os polícias, as estradas, as linhas e a matéria, a forma e a disciplina são domados e submetem-se impotentemente à prática, à sabedoria e à experiência.
Percebo que a ordem tenha as suas vantagens. Permitiu que se alcançassem muitas coisas boas. Mas não devemos pensar que a ordem e a forma são tudo. Temos que ter isso em conta quando atravessamos um cruzamento em Nova Deli como turistas, ou quando negociamos com a Índia políticas alfandegárias e financeiras como diplomatas ocidentais.
Isto como pano de fundo leva claro ao tema da dependência e dos extremos. Somos dependentes da matéria, do consumo, da asspeticidade? Reagiriam os ocidentais mesmo de forma mais debilitada a uma catástrofe ambiental planetária do que habitantes de outros continentes? E limitando a análise à psique, o quão estão os europeus mentalmente mais fortes desde que ultrapassaram todos os outros povos e civilizações em termos de esperança de vida, inovação tecnológica e planeamento urbano?
Afinal, enquanto todos os dias em que percorro a minha saloia AE8 vejo cenas de conflito, competição e obscenidades rodoviárias e leio regularmente de mortos a tiro nas auto-estradas europeias por causa de indefiníveis quezílias rodoviárias, num ano em Nova Deli de mota, rodeado daquele caos, não me lembro de ver uma única discussão, quanto menos um único gesto ou palavra obscena originada por questões rodoviárias.
Querem contra-prova? Os únicos momentos em que assisti a tensão nas ruas e avenidas de Deli foi quando os grandes pretos carros e jeeps de vidros fumados da emergente classe média urbana ocidentalizante se permitia atropelar esta calma. Achando-se algo mais, e despojados da essência tradicional indiana que é a base da calma rodoviária que vos anteriormente descrevi, acelerados pela pressa de chegar ao local de consumo ou produção (ou ao contrário, sai ao mesmo) e cegados pelo Ocidente capitalista e brilhante, enconstam as grossas jantes das suas potentes máquinas aos frágeis triciclos fazendo-se tombar como se fossem pequenas peças de Lego.
Estive na presença de umas poucas pessoas quando viam o vídeo e ouvi mais algumas comentar sobre ele. Primeiro, poucos se apercebem que aquilo é mera fotomontagem. Segundo, em tom de D. Gracinda que relata um acidente catastrófico ali na esquina do café, submetem-se totalmente ao incompreensível - o que é compreensível porque simplesmente é inexistente. Terceiro, paira no ar um misto de admiração e nostalgia.
O meu pai conta que nos anos 60, quando estudava na Alemanha, se encontrava hospitalizado num quarto com vista para um cruzamente com semáforos. Sempre que estes deixavam de funcionar, o que acontecia com alguma regularidade, ouvia imediatamente ou assistia ao vivo a acidentes rodoviários porque os condutores alemães não sabiam reagir perante a demissão da autoridade suprema semaforária.
Utilizei um exemplo alemão porque me parece mais constrastante com a experiência indiana. Portugal encontra-se no meio. Portanto, em termos ocidentais, a ordem tornou-se um pouco numa obsessão - se me permitem. A ordem, a disciplina e o formalismo em excesso levam à decadência moral, tal como a excessiva dependência do material que nos rodeia mais do que nunca. "Só um Sith pensa em extremos" como me avisa um amigo, parafraseando um boneco de cinema.
Voltando ao cruzamento, há nostalgia, porque há incapacidade ocidental de voltar ao caos primordial - não necessariamente bom, sublinho. Na Índia sobrevive. Os cruzamentos, os semáforos, os polícias, as estradas, as linhas e a matéria, a forma e a disciplina são domados e submetem-se impotentemente à prática, à sabedoria e à experiência.
Percebo que a ordem tenha as suas vantagens. Permitiu que se alcançassem muitas coisas boas. Mas não devemos pensar que a ordem e a forma são tudo. Temos que ter isso em conta quando atravessamos um cruzamento em Nova Deli como turistas, ou quando negociamos com a Índia políticas alfandegárias e financeiras como diplomatas ocidentais.
Isto como pano de fundo leva claro ao tema da dependência e dos extremos. Somos dependentes da matéria, do consumo, da asspeticidade? Reagiriam os ocidentais mesmo de forma mais debilitada a uma catástrofe ambiental planetária do que habitantes de outros continentes? E limitando a análise à psique, o quão estão os europeus mentalmente mais fortes desde que ultrapassaram todos os outros povos e civilizações em termos de esperança de vida, inovação tecnológica e planeamento urbano?
Afinal, enquanto todos os dias em que percorro a minha saloia AE8 vejo cenas de conflito, competição e obscenidades rodoviárias e leio regularmente de mortos a tiro nas auto-estradas europeias por causa de indefiníveis quezílias rodoviárias, num ano em Nova Deli de mota, rodeado daquele caos, não me lembro de ver uma única discussão, quanto menos um único gesto ou palavra obscena originada por questões rodoviárias.
Querem contra-prova? Os únicos momentos em que assisti a tensão nas ruas e avenidas de Deli foi quando os grandes pretos carros e jeeps de vidros fumados da emergente classe média urbana ocidentalizante se permitia atropelar esta calma. Achando-se algo mais, e despojados da essência tradicional indiana que é a base da calma rodoviária que vos anteriormente descrevi, acelerados pela pressa de chegar ao local de consumo ou produção (ou ao contrário, sai ao mesmo) e cegados pelo Ocidente capitalista e brilhante, enconstam as grossas jantes das suas potentes máquinas aos frágeis triciclos fazendo-se tombar como se fossem pequenas peças de Lego.
terça-feira, 14 de junho de 2005
A imagem portuguesa da Índia
Há dois anos, quando entrevistei o embaixador português na Índia para o meu Supergoa.com, ele queixava-se com certa razão de que "os portugueses ainda têm a imagem da Índia do encantador de serpentes". Eu acho que o problema é capaz de ser outro. Não há imagem nenhuma da Índia.
É verdade, as miúdas que andam lá na minha faculdade na Avenida de Berna de dia e que polvilham as ruelas do Bairro Alto de noite (ou será ao contrário?) já andam de mochila, saia e blusa indiana. É verdade, os 600 turistas portugueses que visitavam Goa (para não falar da Índia) anualmente nos anos 90, passaram a ser alguns poucos milhares agora. Sublinhe-se o adjectivo, no entanto. E é verdade, já não só os saudosistas, salazaristas e militares a falar da distante Índia.
Mas, no fundo, a Índia continua a ser uma imensa mancha negra no mapa-mundo português. Eu notei isso quando anunciava que lá ia, há um ano. Houve reacções de oposição e de encorajamento, mas, na sua grande maioria, as pessoas dedicaram-me uma expressão facial interrogativa enorme e desesperada. Não sabiam o que dizer. Hesitavam. Alguns refugiavam-se no discurso rebelde de que "só faz é bem, ir lá para fora", incluindo a imensidão indiana no saco-cabe-tudo do "lá fora". Outros perguntavam-me se continuaria a estar acessível por e-mail.
A Índia continua assim refém do que eu chamaria "um fosso geracional". Os mais velhos, que por lá andaram nos anos 50, filhos do Império português (que interessantemente, segundo uma tese a publicar por Francisco Bethencourt, no King's College London, nunca terá existido) estão em vias de desaparecimento, para além de estarem conotados com sectores conservadores pouco na moda. Uma geração intermédia tem claramente mais que fazer, como em Bruxelas ou até no Brazil e em África (poucos), e vive também sob o manto do trauma colonial. Finalmente, os mais novos, a geração sub-30 e mesmo sub-40, tende a perguntar-me como é que está a construção da barragem e a preservação das gravuras rupestres quando lhes falo em Goa. Há que redescobrir a Índia, parece-me.
Perdoem-me o meu tom que pode parecer censurador. Mas eu mesmo hesito muitas vezes. Fazem-me crer que sou um Fernão Mendes Pinto do século XXI, mas na realidade não sou mais do que um estudante internacional em mobilidade. Mobilidade contra a corrente? Nem por isso. 2000 km acima de nós a maioria dos escandinavos tiram pelo menos um ano depois do secundário para viajarem pelo mundo não-ocidental ou para fazerem estágios no apoio ao desenvolvimento nos países que os meus colegas chamariam "os mais encavados". Nova Deli capital terceiro-mundista? Nem por isso. O que iriam para lá fazer tantos chefes-de-estado nestes últimos meses, a não ser negociar contratos de investimento, aumento de "green cards", programas de intercâmbio e pacotes de armamento?
Mas há mudança. Contrastando com o enorme vácuo de há um ano, as pessoas que me encontram agora já dizem algumas banalidades. Normalmente comentam que a Índia "tá em grande nas tecnologias da informação e nos computadores e nisso tudo", claro que nunca deixando de fora o comentário mais ou menos jocoso (depende se estou aqui no Rogel com o meu mecânico ou com um licenciado em Lisboa) que "eles também são mais que as mães / são marrões / são inteligentes e trabalhadores". E o comentário bónus é sobre a questão militar porque "eles têm capacidade nuclear" e depois vêm umas palavras complicadas como "proliferação" ou banais como "ainda nos caem as bombas na cabeça". E há também leve mudança porque vejo que entre as gerações mais novas de portugueses – mesmo que décadas em atraso comparativamente às suas congéneres europeias – já há mais pessoas a abrir os olhos e a fazer as malas, explorando as manchas negras do nosso mapa-mundo que em tempos foi o melhor do planeta.
Espero que possa haver mais mudança. Aliás, é surpreendente a parca informação sobre a Índia que cá chega. Mas isso fica para outro apontamento.
É verdade, as miúdas que andam lá na minha faculdade na Avenida de Berna de dia e que polvilham as ruelas do Bairro Alto de noite (ou será ao contrário?) já andam de mochila, saia e blusa indiana. É verdade, os 600 turistas portugueses que visitavam Goa (para não falar da Índia) anualmente nos anos 90, passaram a ser alguns poucos milhares agora. Sublinhe-se o adjectivo, no entanto. E é verdade, já não só os saudosistas, salazaristas e militares a falar da distante Índia.
Mas, no fundo, a Índia continua a ser uma imensa mancha negra no mapa-mundo português. Eu notei isso quando anunciava que lá ia, há um ano. Houve reacções de oposição e de encorajamento, mas, na sua grande maioria, as pessoas dedicaram-me uma expressão facial interrogativa enorme e desesperada. Não sabiam o que dizer. Hesitavam. Alguns refugiavam-se no discurso rebelde de que "só faz é bem, ir lá para fora", incluindo a imensidão indiana no saco-cabe-tudo do "lá fora". Outros perguntavam-me se continuaria a estar acessível por e-mail.
A Índia continua assim refém do que eu chamaria "um fosso geracional". Os mais velhos, que por lá andaram nos anos 50, filhos do Império português (que interessantemente, segundo uma tese a publicar por Francisco Bethencourt, no King's College London, nunca terá existido) estão em vias de desaparecimento, para além de estarem conotados com sectores conservadores pouco na moda. Uma geração intermédia tem claramente mais que fazer, como em Bruxelas ou até no Brazil e em África (poucos), e vive também sob o manto do trauma colonial. Finalmente, os mais novos, a geração sub-30 e mesmo sub-40, tende a perguntar-me como é que está a construção da barragem e a preservação das gravuras rupestres quando lhes falo em Goa. Há que redescobrir a Índia, parece-me.
Perdoem-me o meu tom que pode parecer censurador. Mas eu mesmo hesito muitas vezes. Fazem-me crer que sou um Fernão Mendes Pinto do século XXI, mas na realidade não sou mais do que um estudante internacional em mobilidade. Mobilidade contra a corrente? Nem por isso. 2000 km acima de nós a maioria dos escandinavos tiram pelo menos um ano depois do secundário para viajarem pelo mundo não-ocidental ou para fazerem estágios no apoio ao desenvolvimento nos países que os meus colegas chamariam "os mais encavados". Nova Deli capital terceiro-mundista? Nem por isso. O que iriam para lá fazer tantos chefes-de-estado nestes últimos meses, a não ser negociar contratos de investimento, aumento de "green cards", programas de intercâmbio e pacotes de armamento?
Mas há mudança. Contrastando com o enorme vácuo de há um ano, as pessoas que me encontram agora já dizem algumas banalidades. Normalmente comentam que a Índia "tá em grande nas tecnologias da informação e nos computadores e nisso tudo", claro que nunca deixando de fora o comentário mais ou menos jocoso (depende se estou aqui no Rogel com o meu mecânico ou com um licenciado em Lisboa) que "eles também são mais que as mães / são marrões / são inteligentes e trabalhadores". E o comentário bónus é sobre a questão militar porque "eles têm capacidade nuclear" e depois vêm umas palavras complicadas como "proliferação" ou banais como "ainda nos caem as bombas na cabeça". E há também leve mudança porque vejo que entre as gerações mais novas de portugueses – mesmo que décadas em atraso comparativamente às suas congéneres europeias – já há mais pessoas a abrir os olhos e a fazer as malas, explorando as manchas negras do nosso mapa-mundo que em tempos foi o melhor do planeta.
Espero que possa haver mais mudança. Aliás, é surpreendente a parca informação sobre a Índia que cá chega. Mas isso fica para outro apontamento.
Novo blog: Wide views
Meus queridos amigos e leitores (nem todos partilham a mesma função),
tenho um novo blog em que escrevo sobre Goa, emigrado como sou daquela terra e armado como sou em Che Guevara/Pinochet (pick one). Está em inglês e podem visitar em
http://wideviews.blogspot.com
tenho um novo blog em que escrevo sobre Goa, emigrado como sou daquela terra e armado como sou em Che Guevara/Pinochet (pick one). Está em inglês e podem visitar em
http://wideviews.blogspot.com
domingo, 12 de junho de 2005
Depois de um ano na Índia
Depois de um ano na Índia, ao voltar a Portugal, notei que:
As pessoas se vestem melhor, mais cuidadas
A carne em doses maiores me faz sentir enjoado
Há menos obras feitas, menos construção em progresso
O Benfica é campeão nacional
Está tudo um pouco mais caro
Mantenho os meus bons amigos
A "crise" continua, está em todo o lado
O meu Golf continua um Panzer
O clima piorou, as estações do ano estão em vias de desaparecimento
Sinto saudades da minha vida em Deli
Gosto muito de Lisboa
A televisão está pior do que nunca, é só ligar
Tenho um novo cão, querido, e que o anterior fugiu
Ninguém (ou poucos) lêem jornais
Os carros conduzem menos rapidamente nas auto-estradas
O presidente da minha câmara afinal é bom
O buraco do Túnel do Marquês aumentou
Estou mais velho, um ano
As pessoas se vestem melhor, mais cuidadas
A carne em doses maiores me faz sentir enjoado
Há menos obras feitas, menos construção em progresso
O Benfica é campeão nacional
Está tudo um pouco mais caro
Mantenho os meus bons amigos
A "crise" continua, está em todo o lado
O meu Golf continua um Panzer
O clima piorou, as estações do ano estão em vias de desaparecimento
Sinto saudades da minha vida em Deli
Gosto muito de Lisboa
A televisão está pior do que nunca, é só ligar
Tenho um novo cão, querido, e que o anterior fugiu
Ninguém (ou poucos) lêem jornais
Os carros conduzem menos rapidamente nas auto-estradas
O presidente da minha câmara afinal é bom
O buraco do Túnel do Marquês aumentou
Estou mais velho, um ano
sexta-feira, 10 de junho de 2005
Decadência do Mundo Ocidental (intervalo)
Talvez tenha sido precipitado. Talvez me tenham feito precipitar ou sentir precipitado. Na realidade sinto que devo partilhar convosco a minha visão de um Titanic em naufrágio em que a orquestra ainda vai tocando e acreditando na invicta superioridade. Talvez simplesmente mais um meu intróito estrangeiro aliado à minha necessidade crítica e à minha frustração com o que me rodeia tenha levado a isto.
Antes de intervalar deixem-me então explicar melhor aquilo o que me tem ido na alma.
Primeiro, falar em decadência para mim só faz sentido no Ocidente. Porque é este pedaço do mundo, é esta civilização que sempre defendeu a ilusão da evolução e do progresso e das utopias. E que para isso expandiu a sua utopia e os supostos instrumentos para a alcançar por todo o planeta. É essa a responsabilidade do Ocidente. Como se relaciona hoje a civilização ocidental com essa tarefa, como a instrumentaliza, como a explica ou como a nega?
Segundo, falar em decadência ocidental para mim é acima de tudo uma análise do homem. Dos sentimentos, dos valores, da felicidade ou da infelicidade, da integridade ou da hipocrisia, da rectidão ou de malabarismos. A minha perspectiva é social e moral. Mas obviamente está ligada ao material, tanto na forma da matéria palpável como da matéria como resultado de um sistema de produção. Como vive hoje o homem nas sociedades ocidentais? A que aspira e quais os fundamentos que nutre para atingir os seus objectivos?
Terceiro, falar em decadência ocidental não significa conservadorismo. Significa justamente o oposto. Significa reivindicar uma ruptura com o letárgico arrastamento de algo que se prolonga em mediocridade em vez de se aprofundar em excelência. Algo que permanece porque ninguém ainda se deu conta da sua inoperabilidade ou porque ninguém quer dar conta disso. Falar em decadência pode ser conservadorismo se se defender integralmente a adopção de um sistema de ideias, valores e estruturas do passado. Não é o meu caso, com bem sabem. Qual o sistema prevalecente e o porquê da sua crise? Transformação ou ruptura, mudança ou fim?
Quarto, falar em decadência ocidental não significa uma leitura evolucionista. O mundo ocidental não tem nem decaído progressivamente, nem progredido progressivamente. O mundo ocidental simplesmente acreditou que podia e teima em perceber que deixou de poder, se é que alguma vez pôde alguma coisa. O Ocidente deixou de ser ocidental, se é que alguma vez o foi. O Ocidente faz parte de um ciclo, por mais que lhe custe e por mais que tenha tentado fazer a roda parar. O que me preocupa é se na sua cega procura de uma roda melhor transformou de facto a roda planetária irremediavelmente. Qual o impacto desta utopia ridícula? Como medir o resultado?
Quinto, falar em decadência leva-me a registar que houve mundo chinês, houve mundo árabe, houve mundo romano e houve mundo inca. Paradoxalmente, quando o mundo ocidental mais se assemelha ao mundo na sua totalidade planetária, é também no seu coração que a decadência se dá. Mas é tarde de mais. Como reverter, parar, anular, domar o processo? Como explicar às Américas, às Áfricas, às Ásias? Como reparar a roda e manter os seus diversos raios intactos? Ou já nem há raios na roda?
Mas, sexto, falar em decadência ocidental em princípio nem me obriga a falar em outras potenciais decadências civilizacionais, nem necessariamente estabelecer comparações. Não sou forçado a forjar o Oriente para perceber o Ocidente. Vivemos hoje num planeta claramente ocidentalizado, mais ou menos, pouco interessa. Por isso é preciso analisar o Ocidente porque é ele que engendrou o que hoje vivemos, para bem ou para mal. Por isso basta analisar a decadência do Ocidente e perceberemos como tudo se sonhou e um dia passado se fez e como tudo no presente se desfaz, ou não.
Ficam algumas explicações. Deixarei de massacrar-vos com a "decadência do mundo ocidental". Continuarei com a verdadeira vida em Deli. Mas agora poderão ler apontamentos meus com outros olhos, espero. E vir ver à Índia também porque é que o Ocidente está, estará ou sempre esteve em decadência.
Antes de intervalar deixem-me então explicar melhor aquilo o que me tem ido na alma.
Primeiro, falar em decadência para mim só faz sentido no Ocidente. Porque é este pedaço do mundo, é esta civilização que sempre defendeu a ilusão da evolução e do progresso e das utopias. E que para isso expandiu a sua utopia e os supostos instrumentos para a alcançar por todo o planeta. É essa a responsabilidade do Ocidente. Como se relaciona hoje a civilização ocidental com essa tarefa, como a instrumentaliza, como a explica ou como a nega?
Segundo, falar em decadência ocidental para mim é acima de tudo uma análise do homem. Dos sentimentos, dos valores, da felicidade ou da infelicidade, da integridade ou da hipocrisia, da rectidão ou de malabarismos. A minha perspectiva é social e moral. Mas obviamente está ligada ao material, tanto na forma da matéria palpável como da matéria como resultado de um sistema de produção. Como vive hoje o homem nas sociedades ocidentais? A que aspira e quais os fundamentos que nutre para atingir os seus objectivos?
Terceiro, falar em decadência ocidental não significa conservadorismo. Significa justamente o oposto. Significa reivindicar uma ruptura com o letárgico arrastamento de algo que se prolonga em mediocridade em vez de se aprofundar em excelência. Algo que permanece porque ninguém ainda se deu conta da sua inoperabilidade ou porque ninguém quer dar conta disso. Falar em decadência pode ser conservadorismo se se defender integralmente a adopção de um sistema de ideias, valores e estruturas do passado. Não é o meu caso, com bem sabem. Qual o sistema prevalecente e o porquê da sua crise? Transformação ou ruptura, mudança ou fim?
Quarto, falar em decadência ocidental não significa uma leitura evolucionista. O mundo ocidental não tem nem decaído progressivamente, nem progredido progressivamente. O mundo ocidental simplesmente acreditou que podia e teima em perceber que deixou de poder, se é que alguma vez pôde alguma coisa. O Ocidente deixou de ser ocidental, se é que alguma vez o foi. O Ocidente faz parte de um ciclo, por mais que lhe custe e por mais que tenha tentado fazer a roda parar. O que me preocupa é se na sua cega procura de uma roda melhor transformou de facto a roda planetária irremediavelmente. Qual o impacto desta utopia ridícula? Como medir o resultado?
Quinto, falar em decadência leva-me a registar que houve mundo chinês, houve mundo árabe, houve mundo romano e houve mundo inca. Paradoxalmente, quando o mundo ocidental mais se assemelha ao mundo na sua totalidade planetária, é também no seu coração que a decadência se dá. Mas é tarde de mais. Como reverter, parar, anular, domar o processo? Como explicar às Américas, às Áfricas, às Ásias? Como reparar a roda e manter os seus diversos raios intactos? Ou já nem há raios na roda?
Mas, sexto, falar em decadência ocidental em princípio nem me obriga a falar em outras potenciais decadências civilizacionais, nem necessariamente estabelecer comparações. Não sou forçado a forjar o Oriente para perceber o Ocidente. Vivemos hoje num planeta claramente ocidentalizado, mais ou menos, pouco interessa. Por isso é preciso analisar o Ocidente porque é ele que engendrou o que hoje vivemos, para bem ou para mal. Por isso basta analisar a decadência do Ocidente e perceberemos como tudo se sonhou e um dia passado se fez e como tudo no presente se desfaz, ou não.
Ficam algumas explicações. Deixarei de massacrar-vos com a "decadência do mundo ocidental". Continuarei com a verdadeira vida em Deli. Mas agora poderão ler apontamentos meus com outros olhos, espero. E vir ver à Índia também porque é que o Ocidente está, estará ou sempre esteve em decadência.
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