quarta-feira, 1 de dezembro de 2004

A colega (I)

Estou na cantina da faculdade, na cave, onde às vezes vejo gordas ratazanas fugir da cozinha para as casas de banho ao lado. Há uma pequena escrivaninha à qual está sentada o Babu. O Babu vem do estado do Querala no Sul da Índia e tem um grande bigode sobre um grande sorriso, sempre. É gordinho e o dono do refeitório. À volta dele, à hora de almoço, as pessoas gritam "Babu, Babu, please, Babu" e abanam as notas de dinheiro no ar a ver se ele as atende. Todos empurram e tentam chegar a ele. Pacatamente ele recebe os pedidos e transfere-os com baixos e autoritários gritos para a cozinha onde vários vultos semi-desnudados confeccionam os comeres.

Estou no meio das pessoas. Como sempre espero uns minutos e depois ele olhará para mim como sempre e eu pedirei o meu almoço. Não preciso de gritar "Babu, Babu, please, Babu". Enquanto estou entalado na multidão histérica vou olhando distraidamente à minha volta. Do outro lado da escrivaninha, por entre os castanhos corpos, emerge um olho. Um só. Brilhante e acutilante, olhando-me a mim nos olhos, dirigido objectivamente a mim. Não se passam mais do que dois segundos. Dois segundos em que me apercebo que se trata de um telemóvel com câmara incorporada. Em que alguém me está a fotografar. Em que eu esboço um intuitivo "Hey" e levanto o meu olhar para ver o responsável.

Mas, ao terceiro segundo, o olho desaparece com uma mão a puxar o utensílio metálico para trás, desaparecendo por entre a multidão. A cantina é pequenina. Movimento-me rapidamente. Vejo uma rapariga a correr e chamo-a. Mas ela refugia-se numa mesa com várias raparigas, uma das quais a Sarita, a tal goesa. Não conheço a maioria. Pergunto à rapariga fotografadora "What was that, why are you taking pictures of me?". Respondem-me todas elas com risos histéricos. "This is nothing, go away". Exigo ver o telemóvel e que a minha fotografia seja apagada. "No, go away" cacarejam, sem no entanto me olhar nos olhos, envergonhadas mas descaradas. "Go and make a complaint with GSCASH".

O Gender Sensitation Committee Against Sexual Harrassment (GSCASH) é um órgão institucional da JNU que trata dos casos de discriminação e assédio sexual no campus. Claro que lá não fui. Claro que entretanto, passadas umas semanas sobre o episódio, a minha foto já circula em dezenas de telemóveis femininos da universidade.

2 comentários:

  1. é das orelhas, elas ficam loucas!
    hihiih

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  2. Entao Camarada?
    Há uma semana que está este texto...
    Vou escrever ao nosso primeiro-ministro a fazer queixinhas (tens sorte que ele é semi-inexistente e nao vai fazer nada).
    Pooooooooooooooooooooooortooooooooooooooooooooo!!!!!!!!
    Ass: Jankauskas

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