segunda-feira, 12 de dezembro de 2005

Abu Salem

in EXPRESSO, Edição 1728, 10.12.2005, 1º Caderno

Abu Salem quer voltar a Portugal

A defesa do terrorista indiano extraditado por Portugal luta para o fazer regressar. Diz que está a ser torturado

HÁ um mês, a 11 de Novembro, aterrava em Bombaim um avião proveniente de Lisboa, trazendo Abu Qayoom Ansari, um suposto terrorista, mais conhecido por Abu Salem, e a sua companheira, Monica Bedi, antiga estrela de cinema na Índia. Os dois foram extraditados pela Justiça portuguesa, mas as implicações do complexo processo judicial estão longe de estarem terminadas para Lisboa. «Esperamos poder levar Salem de volta a Portugal», afirmou um dos seus advogados, Ashok Sarogi, ao EXPRESSO.

Sobre Salem recaem mais de 50 acusações, incluindo o envolvimento nos ataques bombistas de radicais islâmicos que em 1993 vitimaram mais de 250 pessoas em Bombaim, o suficiente para poder vir a ser mandado enforcar pela Justiça indiana. Mas disso deverão salvá-lo as condições de extradição impostas por Portugal: não ser condenado à morte nem a pena superior a 25 anos.

Os dois foram detidos pela Polícia Judiciária (PJ), em Setembro de 2002, em pleno Rossio. Tinham chegado a Lisboa em finais de 2001, munidos de seis passaportes indianos e paquistaneses, todos falsos. Casaram com cidadãos portugueses em troca de vários milhares de euros, assim conseguindo autorização de residência, que lhes permitiria obter a desejada nacionalidade portuguesa. Mas um mandado de captura internacional em nome do indiano de 42 anos, enviado pela Interpol à PJ, alterou-lhes os planos. Em Agosto de 2003, o Tribunal da Boa-Hora condenava Salem e Bedi a quatro anos e meio e dois anos de prisão, respectivamente.

Revogar a extradição.

A linha de defesa agora adoptada pela equipa de advogados indianos de Salem, no processo a decorrer em Bombaim, é a de que o acordo de extradição não está a ser honrado. «Ele disse-me que foi torturado pela Divisão Anti-Terrorista (ATS)», afirma Sarogi.

Salem está a ser ouvido por um tribunal criado por uma lei especial antiterrorista (TADA). O seu advogado lembra que, face ao acordo de extradição, «o CBI (polícia de investigação criminal) está a interrogá-lo ilegalmente sobre outros crimes para além dos oito pelos quais Portugal o extraditou». Sarogi pretende, assim, revogar a extradição, prometendo «avançar para os tribunais portugueses para provar que Salem não terá um julgamento justo na Índia». No entanto, o próprio juiz do processo, na semana passada, limitou o número de interrogatórios a Salem e garantiu-lhe livre acesso à Comissão de Direitos do Homem estadual (MHRC). Já Monica Bedi só deverá ser acusada de falsificação de documentos. A imprensa indiana cita-a mesmo, dizendo que «sente falta da prisão em que se encontrava em Portugal (Tires), semelhante a um hotel com várias estrelas».
Respeitar o acordo.

A extradição dos dois acusados obrigou o Governo indiano a investir numa longa batalha legal, que se estima ter custado cerca de 10 milhões de euros e se prolongou por sucessivos recursos no Tribunal Constitucional e no Tribunal Europeu dos Direitos do Homem. Salem exigia asilo político, invocando estar em risco a sua vida nas prisões indianas, apinhadas de antigos inimigos seus de redes criminosas com que rivalizava nos anos 90. Praticante muçulmano, Salem dizia também temer ser alvo de discriminação religiosa, num país maioritariamente hindu, e punha em causa a celeridade e imparcialidade da Justiça indiana. Mas as garantias dadas pelas autoridades indianas convenceram Portugal e a UE.

Alguns juristas indianos têm vindo a público questionar a validade do acordo aprovado pelo executivo indiano e admitem a possibilidade de o sistema judicial seguir o seu próprio caminho, eventualmente condenando Salem à morte. Para Madhu Badhuri, a ex-embaixadora indiana em Portugal que tratou do caso até 2003, não há motivos para alarme. Contactada pelo EXPRESSO, em Nova Deli, acredita que o Governo indiano irá respeitar as condições impostas e salienta a «exemplar cooperação por parte do Governo português».

Constantino Xavier, correspondente em Nova Deli

2 comentários:

  1. Parem as buscas! Está encontrado o Carlos Fino do sub-continente indiano.

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  2. Estou de acordo com o comentário anterior :))

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